«De entre todas as profissões no mundo há uma que merece especial cuidado: a dos economistas "da esfera pública", ou seja, que se ocupam dos grandes sistemas, dos grandes planos, das grandes previsões — e, sobretudo, dos grandes falhanços. Técnicos do Banco Mundial, astrólogos do FMI, parapsicólogos do Banco Central Europeu, tarólogos do Banco de Portugal, professores Karamba da Comissão Europeia, ovnilogistas da OCDE, todos se reúnem para garantir o mais elevado montante possível de capital para distribuir por bancos, "instituições financeiras", construtores de autoestradas e sedes de "instituições europeias" — e falham. E quando tudo falha tratam de recomeçar o jogo, nomeadamente através da criação de "bancos maus" que fiquem com os prejuízos das suas operações, enquanto vão criando "bancos bons" que, mais tarde, no longo ciclo das coisas, hão de tornar-se "bancos maus", e assim sucessivamente. [...]
Ora, esta classe profissional não faz mais do que prolongar — até mais longe do que julgávamos possível — o lema de Samuel Beckett, "falhar, falhar de novo, falhar melhor". Ao contrário de qualquer escritor — que seria banido ao fim de três falhanços de grande qualidade — o percurso dos nossos economistas da "esfera pública" transforma-os em personagens de grande literatura, com a diferença (em relação aos da literatura) de que são sempre agraciados com uma conta bancária muito decente. Inclusive na Caixa.»
Francisco José Viegas, in LER, n.º 142.