Fotografia de José Almeida |
1. Li, algures, que o PS estava a tomar opções políticas que, por si só, jamais tomaria. Quem fazia esta observação aludia a opções concretizadas a nível do Orçamento de Estado e a algumas decisões tomadas a nível do governo e do parlamento. O comentário em questão referia-se, como é evidente, aos condicionamentos a que o PS está sujeito, decorrentes dos acordos que celebrou com o BE, o PCP e o PEV. Isto era dito com um sentido claramente pejorativo. Mas podia ter sido dito com um sentido oposto. Estamos, aliás, perante uma ocorrência comum: um mesmo facto ter interpretações diferentes ou mesmo opostas.
Na verdade, é um facto que o PS está a tomar opções políticas que, por si só, jamais tomaria, e que isso acontece porque está condicionado pelos acordos que celebrou com o BE, o PCP e o PEV. Esta realidade, que é verificada por todos, é tida pelo autor daquela observação como uma situação negativa, perigosa, insustentável. Curiosamente, faço parte do grupo daqueles que vêem esta realidade como positiva, virtuosa e sustentável.
É inteiramente verdade que, se o PS não tivesse celebrado os acordos com os partidos da esquerda parlamentar e deles não estivesse dependente, não estaria a fazer a política que está a fazer. Estaria a fazer, como quase sempre fez, uma política idêntica ou ligeiramente diferente das políticas do PSD e CDS, isto é, uma política idêntica às políticas que o tradicional arco da governação praticou durante as últimas décadas e que conduziu o país a escandalosos níveis de desigualdade e de injustiça social.
É precisamente a circunstância da sobrevivência do governo do PS depender do apoio do BE, do PCP e do PEV que o obriga à tomada de medidas que farão reverter totalmente, em 2016, algumas das situações mais injustas que PSD e CDS geraram, quando governaram coligados (algumas delas — cortes nas pensões e nos salários — iniciadas, como se sabe, por um governo do PS, o de Sócrates). É precisamente a circunstância da sobrevivência do governo do PS depender do apoio do BE, do PCP e do PEV que originou um orçamento de Estado muito diferente daquele que decorreria se dependesse apenas do programa eleitoral do Partido Socialista. É justamente a circunstância da sobrevivência do governo do PS depender do apoio do BE, do PCP e do PEV que fez com que a banca e as grandes empresas tenham, em 2016, um aumento de impostos.
É, portanto, inteiramente verdade que o governo do PS está a tomar opções políticas que, por si só, jamais tomaria. Uma «pequena» diferença que pode fazer alguma diferença...
2. Uma das prioridades do novo presidente eleito, Rebelo de Sousa, vai ser a de criar condições para que esta situação termine o mais rapidamente possível, e que PS e PSD deixem de ser irmãos desavindos. Rebelo de Sousa irá empenhar-se activamente (ainda que também discretamente) para que se regresse ao pântano político do bloco central. Se o novo presidente conseguir realizar este objectivo, muitos dos que votaram em Rebelo de Sousa vão arrepender-se de o terem feito. Mas, como é hábito entre nós, nessa altura, já será tarde.