Fotografia de Gustavo Almeida. |
A trapalhada que envolve o ministro das Finanças é lamentável. Lamentável para o próprio, lamentável para o país e lamentável em relação ao que (mais uma vez) revela sobre a ética política do PSD e do CDS.
Para o próprio, porque sai política e eticamente desgastado. Para o país, porque, evidentemente, sai a perder com a fragilidade política do ministro. Para o PSD e CDS, porque o retrato que deles fica é (mais uma vez) miserável, na medida em que aquilo que verdadeiramente move estes dois partidos não é saber se Mário Centeno celebrou ou não um acordo com Domingues (acordo que eles até subscreveriam...), o que os move é o desejo de achincalhar com o intuito de fragilizar todo o Governo — os fins justificam os meios. Na realidade, a mentira nunca foi para o PSD e CDS um problema ético, nem sequer político, caso contrário, Passos Coelho teria sido derrubado, por acção dos deputados desses dois partidos, do cargo de primeiro-ministro poucos meses após ter tomado posse. Na história recente da democracia portuguesa, não houve um primeiro-ministro que tivesse mentido tanto como mentiu Passos Coelho — nem mesmo Sócrates. Repugna, por isso, ver o comportamento descontrolado dos dirigentes do PSD e do CDS, na busca obsessiva pelo exercício conspurcado da política.
Todavia, o que interessa é saber qual foi a causa desta trapalhada que envolve Mário Centeno. Erros de percepção, como alega o ministro? Não parecem ter sido — parece até duvidoso que tais erros de percepção tenham acontecido. O que, na verdade, gerou este problema é uma opção por valores que conduzem a caminhos tortuosos, opção feita pelo ministro Centeno e pelo primeiro-ministro António Costa.
Ao que parece, a cultura de valores destes dois governantes vê no sector privado o expoente da competência e da eficácia. E, à luz dessa valorização, e de modo a aliciar alguns protagonistas desse mundo privado para a CGD, decidiram, sem pudor político nem ético, começar a pagar vencimentos pornográficos, alterando, para esse efeito, o estatuto do gestor público. Do mesmo modo, não lhes repugnaria, como agora é claro, isentar esses protagonistas do sector privado em trânsito para o sector público das obrigações legais que os gestores das empresas públicas têm, isto é, da obrigação de apresentarem declarações de rendimentos ao Tribunal Constitucional.
Este quadro de valores não é aceitável. Hipotecar a exigência de rigor, de transparência e de equidade salarial no exercício de qualquer cargo ou função pública é optar por valores que indicam um caminho oposto àquele que deveremos seguir. É optar por valores que se opõem à cultura que elege os bens públicos e as exigências das funções públicas como modelos a seguir pela sociedade.
A origem da trapalhada é esta. Se os valores que norteiam a prática política destes dois governantes fossem outros, a trapalhada não teria existido.