sábado, 31 de maio de 2008

A questão da «excelência» e a imposição de quotas

Para justificar a imposição de quotas para as classificações de «Excelente» e de «Muito Bom», o governo repete, à saciedade, o argumento - importado do mundo empresarial; mais um, é a grande moda – de que, sem essas quotas, todos, ou quase todos, os professores acabariam por ser classificados de «Excelentes» e de «Muito Bons». E, desse modo, só com a existência de quotas é que se assegura que só mesmo os ««excelentes» sejam avaliados como tal e os «muito bons» também.
Ontem, Jorge Pedreira, secretário de Estado da Educação, sentiu necessidade de o reafirmar: «Em qualquer grupo [profissional], se todos puderem ser excelentes o que está errado é a própria definição de excelência».
Vejamos.

1. Poderíamos começar por analisar o termo «excelência», e ver se ele nos remete, necessariamente, para algo de restrito, isto é, se «excelente» (= magnífico, óptimo, brilhante, notável) deve ser entendido como sinónimo de «excepcional» (= raro, único). Como se sabe, não são palavras sinónimas, ainda que possam ser usadas como sinónimas, mas não o são, necessariamente. Contudo, é assim que a ministra da Educação e a sua equipa as usam, quando lhes convém, ou seja, usam o termo «excelente» no sentido de «raro», «único» – e só assim se poderá, eventualmente, compreender que digam o que dizem. Mas, se assim é, deveriam tê-lo assumido desde o início, e a classificação máxima da avaliação de desempenho dos professores ter-se-ia denominado de «Excepcional» e não de «Excelente». Ao contrário do que possa parecer, isto não é uma «questão de lana-caprina», porque tem implicações decisivas.

2. Peguemos num exemplo: temos duas equipas de futebol ou de râguebi ou de investigação científica ou do que se quiser e apliquemos-lhes os qualificativos «excelente» e «excepcional».
Equipa X – Constituída, na sua totalidade, pelos melhores atletas ou cientistas do mundo. Significa, portanto, que eles são todos «excelentes», mas, na equipa, nenhum pode ser considerado «excepcional», exactamente, porque sendo todos «excelentes» nenhum é «raro», nenhum é «único».
Equipa Y – Constituída por atletas ou cientistas em que só um é «excepcional». Exactamente, porque para um ser «excepcional» os outros têm de ser considerados inferiores a esse «excepcional», se fossem equiparáveis, já aquele não seria, como é óbvio, «excepcional». Esse «excepcional» poderá, eventualmente, ser «excelente», mas não é, pela definição de «excepcional», obrigatório que o seja.

Pergunta: Qual das duas equipas escolheríamos como nossa, a X ou a Y? Escolheria alguém a Y?! A X dá-nos a garantia de que todos são «excelentes», a Y só nos garante que um dos seus membros é «excepcional», nada mais. Nem sequer nos garante que esse «excepcional» seja «excelente». Naquela equipa, ele é «excepcional» porque, comparativamente com os outros, é «único», mas nada impede que seja inferior a «excelentes» de qualquer outra equipa.
Se estas equipas estivessem sujeitas a quotas, a equipa X não poderia existir. Se apenas pudesse ter 10% de «excelentes», teriam que ser despedidos 90% dos atletas ou dos cientistas ou do que quer que fossem.
A equipa Y, não precisaria de ser mexida, a quota de 10% estava assegurada. Mas tínhamos uma equipa que, provavelmente, andava a lutar para não descer de divisão ou cujos cientistas nunca tinham conseguido escrever, nem sequer uma nota de rodapé, na Nature.
Se quisermos transformar as equipas X e Y em escolas X e Y, ficamos a saber que modelo de instituição escolar o ministério da Educação acabaria por produzir, seguindo a lógica do «excelente» como sinónimo de «excepcional».

3. O «excepcional» não vale por si mesmo, vale apenas comparativamente. O «excepcional» não nos remete para nenhum dimensão objectiva nem substantiva. O «excepcional», ontologicamente, não existe. Um medíocre, por exemplo, é «excepcional» se estiver no meio de maus.
O «excelente», pelo contrário, representa uma realidade objectiva, objectiva no sentido de ser previamente definida pela enunciação de um conjunto convencionado de caracteres que a constituem. Através de critérios, também previamente definidos, é possível avaliar se alguém atinge ou não atinge essa realidade. Ora a parafernália de itens avaliativos que o ministério definiu (mal, pessimamente, como sabemos, mas para o caso não interessa) pressupõe isso mesmo: a existência de uma realidade substantiva à qual se acede ou não se acede segundo uma avaliação realizada com critérios que o ministério definiu.
Ora, isto mostra como o Ministério da Educação vive enredado nas contradições que engendra. Por um lado, dá o significado de «excepcional» ao «excelente», quando diz que as quotas existem para impedir que todos possam aceder a esse patamar; por conseguinte, só quer lá alguns, isto é, remete-nos para o seu carácter «excepcional». Por outro lado, estabelece um quadro definidor do que deve ser considerado «excelente», mas não possibilita que todos que o alcancem, mesmo que cumpram todos os critérios por ele (Ministério) definidos.

4. Conclusão.
A «excelência» define-se por um quadro de referências, neste caso, definido (ainda que mal) pelo Ministério. Portanto, ao contrário do que diz a ministra da Educação e os seus adjuntos, não deveriam/não poderiam nunca existir restrições ao acesso a esse nível, para quem, de facto, o atinge. Se atinge os requisitos estabelecidos é «excelente», se não atinge não é «excelente», mais nenhum outro critério é sério.

Das quatro uma: ou o Ministério quer a «excelência» e aceita que quem a atinge é classificado como tal; ou o Ministério não está preocupado com a «excelência» e o que quer, na realidade, é, exclusivamente, poupar dinheiro; ou Ministério não dá credibilidade ao quadro referencial de «excelência» que ele próprio definiu; ou o Ministério não dá crédito ao processo de avaliação que ele próprio gizou.
A primeira hipótese está afastada, restam as outras três. Em alternativa ou... cumulativamente.

5. Este assunto ainda tem outros quês e lês, mas isto já vai longo e hoje é sábado.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

PROmova

Ao blogue chegou este e-mail, que divulgamos:

Caros colegas,

Temos recebido inúmeros feedbacks a alertar para a exiguidade do espaço reservado para a realização do Encontro de Professores, agendado para as 10.00 horas do dia 7 de Junho, face à perspectiva de mobilização dos educadores e professores para este evento. Neste sentido, solicitamos o favor de os colegas nos fazerem chegar, via e-mail (profsmovimento@gmail.com) ou sms (962333988), uma intenção de participação no Encontro (em termos individuais ou em grupo de colegas – indicando o número de elementos), de molde a podermos efectuar uma previsão mais realista das presenças, que nos permita, atempadamente, disponibilizar o espaço mais apropriado.

Aquele abraço solidário,

PROmova

Antigo porta-voz acusa Casa Branca de manipular a opinião pública na guerra do Iraque

Para visionar o vídeo, clicar na ligação:

http://www.publico.clix.pt/videos/?v=20080529121623&z=1

Camionistas protestam em Londres

Para visionar o vídeo, clicar na ligação:

http://www.tsf.pt/paginainicial/AudioeVideo.aspx?content_id=921826

XXXI FITEI - Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica

De 28 de Maio a 8 de Junho, decorre, no Porto, a 31.ª edição do FITEI.
Espectáculos de teatro, dança e novo circo vão ser apresentados por sete companhias portuguesas, cinco espanholas e uma brasileira.
Sítio oficial: http://www.fitei.com

Charlie Parker

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Espertos vs. inteligentes

«[...]uma coisa se torna clara - já era clara, mas entra agora em redundância: este é o resultado do hiper-liberalismo que anda na moda. Por tudo e por nada (sobretudo por nada), dizem-nos: é preciso reduzir o peso do Estado... que peso e que Estado, remetido que ele está à condição de polícia de giro? E garantem-nos, sabiamente, algo que há muito se sabe estar errado: que o mercado, que a economia, quando completamente livre, se auto-regula na perfeição, sem precisar de incómodas intervenções políticas, produzindo riqueza para todos...
Pois. Vê-se.

Esta
[crise mundial dos cereais] - entre outras realidades igualmente escandalosas - deveria bastar para que todos os Governos e todos os governantes fossem chamados seriamente à pedra, a prestar contas do esterco político que andam a produzir e que não serve nem mesmo para a biomassa.
[...]
Não é preciso ser profeta nem médium para poder dizer que estamos a caminhar para um cataclismo social sangrento, à escala mundial.
Resta saber, apenas, se somos suficientemente inteligentes para sabermos evitá-lo. Ele não é uma fatalidade do destino; mas estamos a ficar seriamente encostados à parede
[...]
Enfim. O que quero dizer é que é tempo, mais que tempo, de acordarmos, nós, o tão manipulado, tão engraxado (em época de eleições) povo soberano.

No fundo, a coisa é simples: até agora, o mundo tem sido exclusivamente dos espertos; talvez não fosse pior se começássemos a dar voz aos inteligentes.»

João Aguiar, Super Interessante, número 122, Junho 2008

Separatismos

A propósito do que está a ocorrer em Itália, com a exponencial subida eleitoral da Liga Norte, que defende a separação entre o norte e o sul do país; na Bélgica, com a forte probabilidade de uma ruptura definitiva entre os flamengos do norte e os valões do sul; na Espanha, com os nacionalismos basco e catalão; e na Escócia, onde vai realizar-se, em 2010, um referendo para decidir o corte umbilical com o Reino Unido; Roberto Pompeu de Toledo escreve um artigo na revista brasileira Veja, desta semana, cujo conteúdo merece reflexão.
Começa este cronista por observar um paradoxo: a gradual construção da União Europeia, isto é, o projecto congregador de 27 países e o movimento oposto «do levante das paróquias». E identifica as duas principais causas do separatismo europeu. Por um lado, a defesa da própria língua e a intolerância para com o outro (algo que ele vê como comum aos separatismos em Espanha e na Bélgica) e, por outro lado, a oposição entre regiões mais ricas e regiões mais pobres (casos da Catalunha, Flandres e norte italiano, nos respectivos países).
O artigo termina deste modo pertinente/provocatório:
«A primeira moral dessas histórias é que os europeus não têm razão para estranhar as disputas africanas entre tutsis e hutus em Ruanda, quicuios e luos no Quénia, árabes e nubas no Sudão. Suas próprias tribos não são menos incompatíveis umas com as outras. A segunda é que dos povos e dos países não cabe esperar que tenham encontrado o ponto final de suas histórias porque são como os indivíduos. Por mais contemplados pela riqueza e pelo bem-estar, sempre haverá algo que os balance. Se não há inimigos externos, inventarão inimigos dentro de si mesmos. A inquietude vigia sem descanso para impedir a vitória do conforto que vem da riqueza e da harmonia que vem do bem-estar. Assim como não há homem pronto nem mulher pronta, também não há país pronto nem povo pronto.»
Independentemente de alguma superficialidade na identificação das causas do separatismo europeu, as observações de quem nos vê do outro lado do Atlântico remetem-nos, do meu ponto de vista, para o complicado problema da relação entre o passado e o futuro, isto é, para o modo como gerimos o nosso passado enquanto constituinte da nossa identidade e o modo como, a partir daí, conseguimos ou não conseguimos projectar um futuro com sentido.
Para além dos oportunismos mais vis, dos mais repugnantes interesses em jogo de parte a parte e dos comportamentos criminosos de ambos os lados (não em todos, mas em alguns dos países referidos), o problema existe, é uma realidade, porque algo lhe dá substância. E penso que um dos principais elementos, se não mesmo o mais importante, dessa substância é o modo como conceptualizamos, sentimos e vivemos a nossa identidade na encruzilhada entre o passado e o futuro.

Sonda Phoenix envia imagens de Marte

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terça-feira, 27 de maio de 2008

Orquestra Sinfónica de Londres

Ciclo Grandes Orquestras Mundiais — hoje, às 21,00h, concerto no Coliseu de Lisboa, dirigido pelo maestro sir Collin Davis. Obras de Shubert e Bruckner.

Razão-emoção individual-emoção social

António Damásio ao Expresso:

1. «Nos comportamentos humanos, e nos animais, há um ciclo de prazer que pode levar a uma ruptura de toda a espécie de auto-regulação. Certos animais, ratinhos, se tiverem a possibilidade de se auto-estimularem ao nível do cérebro de forma a produzirem um estado de prazer sexual, podem continuar a buscar esse estado de prazer sexual de forma tão repetida que pode levar à sua auto-extinção. É uma espécie de loucura. Podem morrer a auto-estimularem-se. [...] Algumas pessoas mimadas pelos prazeres têm comportamento semelhante. Tudo pode acontecer. A mesma natureza humana que leva ao sublime, na construção social, científica ou artística, é a que usa o mundo em benefício próprio, com completo alheamento do que se passa à volta. Tudo depende da forma como a razão consegue funcionar em relação aos afectos.
[...] Voltando a Espinosa, ele tem a ideia muito curiosa, e distinta de outros filósofos, de que opor a razão à emoção não é um modo eficaz de regular as emoções. A tradição kantiana de que devemos opor a vontade à paixão, dominá-la, para o Espinosa não é suficiente. Uma emoção que não está controlada, que é nefasta, deve ser dominada por uma emoção mais forte do que a primeira, embora essa emoção seja aplicada através da razão.»

2. «O que estou a fazer na Califórnia, no Brain and Creativity Institute, é tentar investigar a neurobiologia das emoções centrada nas emoções sociais. Há emoções e há o espaço das emoções sociais, consideradas como o resultado da educação, das estruturas sociais e culturais.
[...] A forma como regulamos as nossas relações sociais não pode ser concebida como o resultado exclusivo dessas relações sociais. Elas são a tradução das tendências emocionais presentes no genoma humano e em outras espécies. Concebo essas emoções sociais, neste momento, como sendo em boa parte o resultado de processos biológicos organizados para responder a certas situações sociais, e que são subsequentemente ou reprimidos ou reforçados pela educação e a aculturação. Dou um exemplo, a criança muito possivelmente tem uma tendência para sentir compaixão quando vê o sofrimento ou carência. O que a sociedade vai fazer através da pressão dos pares, "peer Presssure" — pais, escolas — é accionar ou reprimir essa tendência. Isto pode chocar os que acham que tudo se explica através da cultura. A influência da cultura é enorme, a admiração pelos outros é educativa. Aquilo em que estou interessado é perceber como utilizamos estas emoções sociais para construir esquemas éticos e políticos. Pensar a criatividade dentro de um espaço social em vez de exclusivamente ligada às artes e ciências.
[...] A raiz é a mesma. E todos estes processos têm um objectivo que se pode descrever em abstracto: tentativa de busca de equilíbrio biológico, procura de bem-estar»
Entrevista ao Expresso (24/5/08)

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Comité Judicial do Senado dos EUA pede explicações a petrolíferas

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Corpo-cérebro-mente

António Damásio ao Expresso:

«[...] Existe um corpo, "body-proper", existe um cérebro dentro do corpo, que tem tido como função na evolução biológica a regulação da vida do corpo. Existe cérebro não necessariamente para escrever poesia, ou apreciar música. Existe cérebro porque é necessário coordenar a regulação de um corpo num meio ambiental complexo. Se o meio fosse simples e as condições do corpo fossem simples, era possível com pequenos ajustamentos puramente corpóreos, sem cérebro, manter a vida. O problema é que , através da evolução, o corpo ganha novas unidades, novos sistemas ligados uns aos outros, enquanto o meio se torna também mais complexo, com perigos e oportunidades que se multiplicam.
[...]Por tudo isso, o cérebro torna-se mais complicado. Desenvolveu-se assim um espaço que podemos chamar mental, que não é separado, e que é o resultado de todo esse funcionamento de organismo integrado do corpo com o cérebro dentro do corpo. O fundamental da actividade do cérebro, regular a função da vida, tem como efeito colateral a produção de uma coisa a que chamamos mente, a produção de imagens de toda a espécie, resultado da modificação do corpo ou de partes especiais do corpo que são os nossos órgãos sensoriais.
[...] O corpo é uma espécie de antena receptora de todas estas modificações, umas no interior, outras no exterior do corpo. O cérebro produz as imagens de todas essas modificações. A mente surge não como uma categoria especial, separada, mas como qualquer coisa dentro do organismo, dentro do cérebro que está dentro do organismo. E surge também como efeito colateral desse desejo do organismo de perdurar, aquilo que qualquer biólogo reconhece logo e que o Espinosa reconheceu, que é o desejo invencível de continuar. O que todos temos de fazer é regular a nossa vida. Às vezes produzimos um grande vale de lágrimas, às vezes produzimos a grandeza.»
Entrevista ao Expresso (24/5/08)

Comentários?

(António Damásio dirige o Brain and Creativity Institute da University of Southern California, em Los Angeles. Amanhã, será publicado outro excerto da entrevista)

sábado, 24 de maio de 2008

Escolas têm um psicólogo por quase dois mil alunos

«As escolas públicas portuguesas têm um psicólogo por uma média de 1986 alunos [...]. O Sindicato Nacional dos Psicólogos lembra que o rácio recomendado pelo Conselho Nacional de Educação é de um psicólogo por 400 alunos, e que há profissionais com "dezenas de escolas a seu cargo".»
In Público (23/5/08)

Como não tem efeito mediático e custa dinheiro, a ministra da Educação, nos três anos de governo que já leva, não fez nada para alterar esta situação.
Zurzir os professores e aplicar medidas facilitistas para os alunos (Estatuto do Aluno e a recém iniciada campanha contra as reprovações) rende mais votos.

Factos

. Em 2006, éramos o segundo país na União Europeia, com maior desigualdade entre ricos e pobres. Atrás de nós, só a Letónia.

. Em 2007, o investimento estrangeiro, em Portugal, caiu mais de 50%.

. No primeiro trimestre de 2008, o crédito malparado atingiu um máximo histórico, segundo o último Boletim Estatístico do Banco de Portugal.

Estes são alguns dos factos, anunciados esta semana, que o marketing do governo e a arrogância do primeiro-ministro já não conseguem esconder.

Finalmente, ditadura birmanesa permite ajuda internacional

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quinta-feira, 22 de maio de 2008

Alguém preencheu os cupões…

Sem saber como, dou por mim inscrita numa prova de atletismo, com contornos sui generis. Uma prova global, onde tudo é medido à velocidade do tempo. Não importa o desempenho. Não partimos ao mesmo tempo. Não há controlo anti-dopping. O que importa é correr, desalmadamente, desmesuradamente. Todos correm, como num conto de Kafka, repetidamente, todos os dias, sem nunca ver a meta. Vejo-me, eu, em posição de partida, é Setembro, corro para uma, múltiplas planificações, para cumprir um horário, é Dezembro, quase fujo do atropelo da avaliação do desempenho, corro para outras avaliações, é Março, arquejo e corro, vou para a rua, corro e marcho, somos muitos, corro sobre pilhas de documentos, a letra miúda de despachos e decretos, a letra transviada daqueles que correm para “passar de ano”, é Maio, o batimento cardíaco avisa-me que preciso abrandar, mas corro, para cumprir programas, numa pernada vou entrar em Junho, já não aguento mais, e corro, e continuo sem saber para onde. À minha volta ouço passadas fortes, outros percursos, uma mesma corrida desnorteada, poupar, é o Governo que corre, arrecada números, pelo caminho, atropela outros participantes, tropeçam todos, corre cada um para seu lado. Ouço aplausos e apupos, também eles de corrida, efemeramente, tudo é passageiro e, paradoxalmente, tudo se me afigura interminável, foram-se os sinais de abrandamento, de limite de velocidade. Hoje mesmo, um casal corria para atravessar a estrada, sob a chuva, à frente de um carro que não conseguia travar, e corria… a fuga quase mortal para a frente. É para aí que vamos?!? Então, porquê a pressa? Inspiro tão profundamente quanto posso, quero parar esta história onde não há vencedores, onde os lesionados proliferam e ninguém quer saber, na alucinação colectiva da jornada involuntária. Pego no comando, pressiono a pausa, inútil, este programa está viciado!

Não há nada como ser «tuga»

Excerto da crónica de Ricardo Araújo Pereira:
«Ser apanhado a fumar dentro de um avião foi das atitudes mais populares que José Sócrates já tomou. Conhecendo o povo português, será difícil encontrar alguém que não tenha passado a simpatizar mais com ele. O homem violou uma lei que ele mesmo inventou. O Sócrates, esse malandro, aprovou uma lei chata para os fumadores, mas o Sócrates esse companheiro, transgrediu-a logo que pôde. O Sócrates, o nosso Sócrates, mostrou-lhe como é. Passou-lhes a perna. [...] O primeiro-ministro José Sócrates é, no fundo, um tuga.»
Visão (22/5/08)

Sócrates condenado a indemnizar jornalista

No passado dia 15 de Maio, o Tribunal da Relação de Lisboa condenou José Sócrates a pagar dez mil euros de indemnização ao jornalista António Cerejo, do Público.
Em 2001, quando era ministro do Ambiente, José Sócrates acusou aquele jornalista de ser «leviano e incompetente», de sofrer de «delírio» e de estar ao serviço de «propósitos estranhos à actividade de jornalista.»
Este é aquele José Sócrates que não gosta de ser criticado, mas que permanentemente acusa tudo e todos, de tudo e de mais alguma coisa, com a maior desfaçatez.
O condenado recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça.
Pode ser que a pena aumente.

Caetano Veloso (Hable con Ella)

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Um certo espiritozinho

«Portugal parece a pátria dos amores tristes e dos grandes naufrágios.
[...]
Mais ainda talvez do que em nós, espanhóis, encontra-se nos portugueses o culto da dor. E esse culto não assume neles um certo carácter de ferocidade bravia que teve entre nós.
[...]
Dizia-me uma vez Guerra Junqueiro que o espanhol mais crente e mais piedoso já deixou escapar da boca, em algum momento de grande contrariedade e apuro, uma blasfémia, um estou-me nas tintas para Deus, por exemplo — ou outra frase pior — enquanto que o português mais crédulo e mais ímpio suspiraria em circunstâncias parecidas um valha-me Nossa Senhora

In Miguel de Unamuno, Portugal — Povo de Suicidas.

É este espiritozinho, entre outras coisas, que faz com que nunca levemos nada até ao fim. Parece que o «bravio», de que fala Unamuno, é coisa que por aqui não pega, somos mais do género: «somos um país pequeno»; «pois, não era possível mais»; «perdemos, mas ganhámos moralmente».
É assim no futebol. É assim na política. É assim no sindicalismo.

Pensamentos de quarta-feira ao fim da tarde

«Os bombeiros são inaptos, ignorantes, totalmente dispensáveis e inúteis no momento e conjuntura actuais.»
José Azevedo, presidente do Sindicato dos Enfermeiros.

«Os portugueses têm a mania de dizer que o Governo não presta. O Governo somos nós. Temos de mudar de mentalidade.»
Paulo Pires, actor.

«Estar no activo prejudica-me.»
Pedro Santana Lopes, político.

In Sábado (21/5/08)

PROmova

Ao blogue chegou este convite, que passamos a divulgar:

CONVITE


O Movimento PROmova não se conforma com o modo como a Plataforma Sindical hipotecou a indignação dos professores e desbaratou o capital de protesto que foi possível conglutinar, enveredando por manifestações folclóricas e esvaziadas de eficácia (penosamente, também esvaídas de participação), que veicularam uma mensagem falseada de pretensa concordância dos professores com o Memorando de Entendimento.

Como estamos convictos que os professores continuam a rejeitar o essencial da política educativa deste Governo, de que o novo modelo de avaliação, entre outros aspectos, é uma peça deplorável, o Movimento convida todos os educadores de infância e professores dos ensinos básico e secundário a participarem num ENCONTRO DE PROFESSORES a realizar no dia 7 de Junho de 2008, pelas 10.00h, no auditório do Instituto Português da Juventude, em Vila Real (junto à Escola EB2,3 Diogo Cão), visando debater o estado actual de descontentamento da classe docente e definir as melhores estratégias de actuação, de acordo com a seguinte agenda:

1. Formas de organização e estratégias de intervenção futuras do Movimento PROmova.
1.1 Definição de um núcleo consensual de reivindicações e de ideias mobilizadoras.
1.2 Acções a concretizar no imediato e no próximo ano lectivo.

A força dos professores e a persistência da nossa luta contra a prepotência e a incompetência desta equipa ministerial depende da presença e da mobilização de todos nós.

Vamos dizer PRESENTE!
Aquele abraço solidário (com o carácter e a firmeza dos princípios),

PROmova

terça-feira, 20 de maio de 2008

João Villaret

Avaliação? Que avaliação? Apontamentos para uma troca de ideias - 3

(continuação da fundamentação da proposição 5)

São, pois, de diversa ordem as objecções a uma avaliação de desempenho exclusivamente interna. Para além disso, são vários os investigadores que concluíram, após a realização de trabalhos de campo em várias escolas, não se ter operado nenhuma diferença significativa na qualidade do corpo docente quando a avaliação é feita pelos pares — Myron Lieberman (1998), Nancy Chism (1999).
Não existindo, como é óbvio, a receita perfeita, a solução mista (avaliação interna e externa) parece ser aquela que possui uma relação mais equilibrada entre os vários prós e os vários contras das alternativas existentes.
A forma de operacionalizar a avaliação externa do desempenho dos professores (não estou, aqui, a referir-me à avaliação externa da própria escola, isso é outro assunto) passa por duas alternativas, que julgo serem as únicas:
a) a existência de um corpo especializado no domínio da avaliação (inspectores, headmasters, etc.), que ficaria responsável pelo processo avaliativo do desempenho em sala de aula de cada professor;
b) a entrega dessa responsabilidade a instituições de ensino superior.
Esta avaliação deveria recair sobre os domínios científico e pedagógico e deveria ter como primeiro objectivo a sua vertente formativa, a que se seguiria a sumativa.
Javier Murillo, um conhecido e experiente especialista neste domínio (coordenou um estudo comparativo de sistemas de avaliação de professores de 50 países), afirmou com muita clareza : «A avaliação externa e a avaliação interna são ambas necessárias e complementares. A avaliação interna deve ser mais uma parte do trabalho dos professores como profissionais sensatos que procuram melhorar a sua prática. Por outro lado, a avaliação externa introduz elementos de objectividade e contribui para uma melhor avaliação. A avaliação com repercussões nas condições económicas ou laborais dos professores deve ser necessariamente externa».
O curioso é que foi isto mesmo que a ministra Maria de Lurdes Rodrigues ouviu deste especialista — assim como de outros três convidados, Gérard Figari (francês), Anne O'Gara (irlandesa) e Gunter Schmid (austríaco) — durante uma conferência internacional sobre avaliação de professores, que decorreu em Lisboa, em Maio de 2007. Esta conferência, que foi organizada pelo Ministério da Educação e presidida pela ministra, teve como objectivo discutir modelos de avaliação e reflectir sobre as práticas de outros países, para daí retirar elementos para o novo sistema avaliativo que estava, na altura, em gestação.
Apesar da opinião unânime destes especialistas apontar para a avaliação mista como sendo a mais equilibrada, a opção foi pela avaliação interna. Porquê? Porque aquilo que verdadeiramente preocupa esta ministra e este governo não é avaliar para melhorar o nosso sistema de ensino. Aquilo que move este governo é, por um lado, aparentar que faz algo de novo, para que a opinião pública pense que se caminha para melhor, e, por outro lado, e fundamentalmente, poupar dinheiro. Ora, sai muito mais barata a avaliação interna do que a avaliação mista. Se isso é pior para o ensino, já não interessa.
Acresce que o governo tinha de, por qualquer meio, dizer que avaliava para poder livrar-se de uma situação que ele próprio criou e que era socialmente insustentável: o congelamento das carreiras. Mas como não fez, atempadamente, o trabalho de casa e como para o governo não tem qualquer relevância a substância das medidas que toma, mas apenas a sua boa aparência, atamancou o processo, avançou com um inqualificável concurso para professores titulares e, depois, com um igualmente inqualificável, mas barato, modelo de avaliação de desempenho, à revelia do caminho que os especialistas apontavam e do que o bom senso aconselhava.
Se o verdadeiro objectivo fosse elevar a qualidade do sistema educativo, nada disto poderia ter acontecido, nem o Estatuto da Carreira que temos nem o concurso para professor titular que tivemos. E, em particular, o modelo de avaliação teria uma componente interna e uma componente externa.
Não sou fundamentalista quanto à obrigatoriedade de observação de aulas para efeitos de avaliação sumativa do desempenho dos professores — na Europa coexistem vários sistemas: os que têm essa obrigatoriedade; os que têm essa obrigatoriedade apenas em alguns níveis de ensino; os que têm essa obrigatoriedade apenas nas situações em que o professor manifesta desejo de subir de escalão na sua carreira; os que têm essa obrigatoriedade apenas quando existe alguma queixa contra o docente; e aqueles em que nunca é realizada a observação de aulas — o que digo é que a existir, e, no contexto actual do nosso sistema de ensino, penso que deve existir (ainda que a sua operacionalização deva ser pensada), a observação de aulas, para efeitos de uma avaliação sumativa, deve ser realizada por uma entidade externa credível.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

O dever da indignação

Nos longínquos (!) tempos do cavaquismo, fui, como muitos outros, ao Congresso "Portugal, que futuro?", promovido por Mário Soares. O então paladino mor da democracia proclamou aí, com o simbolismo que se sabe, que o direito à indignação se havia tornado um imperativo de consciência num Estado democrático corroído pelos males do cavaquismo. Por onde anda agora a capacidade de se indignar de Mário Soares? E dos outros elementos do PS que, supostamente, seriam a reserva moral na defesa dos valores da democracia e da liberdade? Reformaram-se ... até da consciência cívica?
Em dois artigos de uma actualidade inquietante, Joaquim Letria («A geração J») e Batista Bastos («O ranço Salazarista») reflectem sobre o estado a que tudo isto chegou. Diz J. Letria que "A geração que nos governa é a dos enteados do salazarismo ..." e, diz B. Bastos que "... é impossível ver qualquer membro deste governo sem se ser assaltado por uma repugnância visceral ...". É efectivamente isto que sinto.
J. Letria acertou em cheio na identificação da "matriz genética" da estirpe que é hoje Poder. O Padrasto, se fosse vivo, podia até não se rever na incompetência, mas rever-se-ia por certo no estilo e nas intenções.
A repugnância visceral de que fala B. Bastos é um sentimento que não consigo evitar ... o que me pode até trazer evidentes prejuízos de ordem profissional: se ouço com dificuldade, e incontida repugnância, qualquer membro do actual governo, por maioria de razão, já não consigo sequer ouvir Sócrates e Maria de Lurdes! Vejo-me, assim, frequentemente na situação de sujeito "mal/pouco informado", para espanto de colegas de profissão que me abordam na expectativa da troca de uns pontos de vista sobre os tempos que correm. E indigno-me, indigno-me profundamente, por me ver cada vez mais rodeado por gente que repete a linguagem deste Poder, que comenta (?!) a situação na lógica do discurso governamental, que renega servilmente os fundamentos éticos e pedagógicos da profissão, que se resigna para além do que a falta de esperança explica, que apenas quer sobreviver a qualquer preço. É este tipo de "professor" que eles querem, penso ... em voz baixa. E penso no "Discurso sobre o filho da P..." de A. Pimenta, e no que ele escreveu então sobre a escola como "lugar excelso do filho da p..." . E penso que os tempos são outros, oh Pimenta!
A imparcialidade que, toda a vida, busquei como sustento da dignidade no exercício profissional, deu lugar a uma cada vez mais evidente parcialidade, como se a vida fosse um encontro constante de motivações clubistas e eu, qual adepto fanático, quizesse apenas a vitória do meu clube a qualquer preço e visse na derrota do adversário um saboroso triunfo. De facto, a minha maior esperança já é, apenas, comemorar uma derrota. Se possível em 2009.

domingo, 18 de maio de 2008

Bernardo Sassetti, Pedro Burmester, Mário Laginha

Pensamentos dominicais

«Distribuo Viagra porque quero promover o conceito de idoso activo.»
Gonzalo Navarrete, Presidente da Câmara de Lo Prado, Chile.
In Sábado (15/5/08).

«O canudo ao estilo de Sócrates não garante êxito no mercado de trabalho.»
Manuela Ferreira Leite
In Visão (15/5/08).

«Na realidade, basta um copo para me deixar ficar mal. Mas não sei se é o 9º ou o 10º.»
George Burns.
In cervejaria República da Cerveja, Parque das Nações.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

A vítima

O primeiro-ministro violou a Lei do Tabaco que o seu governo elaborou e aprovou.
O primeiro-ministro violou o dever ético, a que devia sentir-se obrigado, de dar o exemplo.
O primeiro-ministro violou o dever ético de respeitar o direito dos outros a não serem poluídos pelas fumaças dos seus cigarros, neste caso, de quem estava a trabalhar para ele.
Apesar de tudo isto, o primeiro-ministro ainda se considera possuído do direito de acusar quem o acusa de praticar «calvinismo moral radical». E acrescenta: «não gosto que se aproveitem de qualquer episódio para me atacarem politicamente» (in Público, de hoje).
Primeira conclusão: o sr. primeiro-ministro pode ter os comportamentos que tiver que não é susceptível de crítica, porque ele não gosta que o ataquem politicamente.
Segunda conclusão: o sr. primeiro-ministro é uma vítima.

Liberdade de escolha...

O bastonário da Ordem dos Advogados parece ter a recorrente necessidade de ser sui generis e, para isso, não olha a meios. Desta vez, apeteceu-lhe criticar o facto de a violência doméstica ser considerada um crime público que não permite à vítima desistir da queixa. E disse: «A mulher deve poder escolher em liberdade [se quer retirar a queixa], desde que as consequências da violência não sejam irreversíveis. [...] Há uma espécie de feminismo impertinente nesta leis».

1. «A mulher deve [...]»?! A mulher?! Para Marinho Pinto a violência doméstica tem obrigatoriamente como vítima a mulher? Em que mundo e em que século vive este homem? Para o bastonário da Ordem dos Advogados, o marido ainda continua a ser o «chefe de família»? Aquele que, quando chega a casa mal disposto, bate na mulher? Para ele, o homem agredido não existe ou a possibilidade de escolha é só para a mulher?

2. «Deve poder escolher»?! A vítima (homem ou mulher, diga-se) leva uma tareia e, por aquelas razões que a razão desconhece, perdoa ao agressor(a), logo, na opinião de Marinho Pinto, o crime apaga-se, deixa de existir, nunca ocorreu. É bonito!
Que a vítima perdoe, isso é um problema entre a vítima e o agressor, agora, que o agressor cometeu um crime e que tem de ser responsabilizado por ele, isso não me parece que possa levantar grandes dúvidas. Quer dizer: uma vítima que, pelas tais razões que a razão desconhece, sucessivamente perdoasse sucessivas sovas ao agressor (e quantos casos existem assim!) poderia sempre ilibar o criminoso; excepto quando as consequências da violência fossem consideradas irreversíveis, isto é, só a partir do momento em que ficasse a vítima desfigurada, paralítica ou por aí fora, aí, sim, é que já poderia haver crime.
Já, agora, sr. bastonário, porque é que nessa altura (desde que não ficasse cerebralmente afectada) a vítima não poderia ter, novamente, «liberdade de escolha» e voltar a perdoar e voltar a ilibar e voltar a candidatar-se a nova sessão de porrada?

É isto feminismo? E impertinente? Sim, senhor.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Herbie Mann

Pensamentos de quinta-feira de madrugada

«Um cínico é um canalha com falta de visão que vê as coisas como elas são e não como elas deviam ser.»
Ambrose Bierce

«Conhece-te a ti mesmo.»
Inscrição no templo de Apolo

«Não te conheças a ti mesmo. Ficarás sempre desiludido.»
Simplicissimus

«Às vezes tenho a sensação de que Deus, quando criou o homem, confiou demasiado na sua capacidade.»
Óscar Wilde

In José Manuel Veiga, Manual para Cínicos.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Muita exigência e muito rigor! Mas só para os outros...

O primeiro-ministro do governo que aprovou a Lei do Tabaco (com a qual, globalmente, eu concordo), o primeiro-ministro que fala permanentemente em rigor, o primeiro-ministro que impôs draconianos sacrifícios aos portugueses, o primeiro-ministro que repetidamente discursa sobre a exigência e a prega a tudo e a todos, é o mesmo primeiro-ministro que se considera isento de tudo aquilo que impõe aos outros.
Infelizmente, não é uma novidade, já o sabíamos. Hoje, só tivemos mais uma confirmação: ficámos a saber que o primeiro-ministro se considera dispensado da proibição de fumar dentro de um avião e, portanto, segundo conta o Público e o Diário de Notícias, tirou umas valentes fumaças durante a sua recente viagem à Venezuela. Este primeiro-ministro considera-se acima dos deveres e do rigor que exige a todos os portugueses, e vai demonstrando isso recorrentemente.
Desta vez, considerou que tinha o direito de ir poluir o ar da zona de serviço do pessoal de bordo do avião em que viajava. Isto é, não só fumou, quando não o podia fazer, como foi fumar para o local onde se concentra quem está a trabalhar. Ora se a Lei do Tabaco foi feita para proteger quem não fuma, conforme o governo não se cansou de publicitar, possuído de que direito se acha o primeiro-ministro de violar o direito dos outros? Ou considera ele que o fumo dos cigarros que fuma é um fumo especial, que não polui pulmões alheios?
Esperemos que, no regresso, não nos surja um primeiro-ministro com a justificação bacoca de que o avião era fretado e portanto dispensado de cumprir a lei.
Do ponto de vista jurídico, já responderam a isso dois ilustres constitucionalista, Jorge Miranda e Vital Moreira, afirmando, sem dúvidas, que o chefe do governo violou a Lei do Tabaco.
Mas mais grave do que a violação jurídica é a violação ética: o primeiro-ministro violou o dever de dar o exemplo e violou o dever de respeito por quem estava a trabalhar e o estava a servir.
A extensão do rol deste tipo de comportamentos, isto é, de comportamentos de absoluta contradição entre aquilo que diz e aquilo que faz, é já insuportável.

Astor Piazzolla, «Oblivion» - Vinicio Allegrini (trompete)

terça-feira, 13 de maio de 2008

A lista «horribilis» - 2

Por sugestão amiga, que diz que há bloguistas preguiçosos que não lêem os comentário (fazem mal, digo eu), adaptei a resposta dada a um comentário feito ao artigo «A lista horribilis - 1» para poder ser colocado aqui, no corpo principal do blogue (a resposta completa está no «link» dos comentários ao artigo). Até porque os problemas que esta lista levanta dão pano para mangas...

A questão que foi colocada, como contraponto à crítica que eu tinha dirigido à listagem da 96 condutas, era basicamente esta: nós, escolas, podemos, ou não, recorrer a algumas das boas condutas das empresas?

Esta pergunta está respondida no artigo «A lista horribilis 1»: «Que o saber é transdisciplinar é óbvio, que as organizações devem aprender umas com as outras é óbvio». 

Mas, já agora, aproveito para reforçar duas notas. As organizações devem aprender umas com as outras, sim: em primeiro lugar, nos erros cometidos, isto é, não repetir erros que outros já praticaram; em segundo lugar, essa aprendizagem é bidireccional, não são apenas as escolas que têm de aprender com as empresas, estas também têm de aprender com as escolas, e muito, a começar, por exemplo, no modo como devem tratar os seus profissionais, que, em muitos casos, é um modo muito pouco humanizado e personalizado.

Portanto, a questão não é se deve haver recíprocas aprendizagens. O problema é outro, e volto a enunciar: «o que não tem nada de óbvio é querer transplantar modelos de um habitat para outro habitat completamente diferente. Uma escola não é uma empresa nem nunca o será, e se um dia o vier a ser já não será escola». Este é que é o problema: querer fazer da escola uma empresa e pensar-se que se pode gerir uma escola como se gere uma empresa. E pensar que se pode avaliar o desempenho de um professor como se avalia o desempenho de um torneiro mecânico ou de um delegado de propaganda médica ou de um corretor da bolsa ou de um engenheiro de máquinas ou de um contabilista ou de... 

A educação é um sector à parte. E isso deve ser dito e assumido. Não é melhor nem pior, é diferente, e o que é diferente deve ter um tratamento diferente. Não se gere nem se avalia uma escola nem os seus professores como se gere e se avalia uma fábrica e os seus profissionais. Ambos devem ser avaliados e geridos, mas com métodos diferentes e, por conseguinte, com instrumentos diferentes.

A lista horribilis revela a crença na avaliação atomizada dos comportamentos. Acredita-se que desmembrando os comportamentos pode-se avaliá-los melhor. Muitos de nós já passámos por, e por nós já passaram, muitas modas/teorias pedagógicas e muitas modas/teorias avaliativas. Tivemos, em tempos já um pouco longínquos, a denominada pedagogia por objectivos que sofria, exactamente, do mesmo mal: acreditava que fragmentando os comportamentos dos alunos avaliava melhor os processos e os resultados finais. Este credo, fundado, como sabemos, no behaviorismo, exerce uma forte atracção sobre muita gente, porque tem a aparência de possuir uma grande cientificidade, um grande rigor e uma grande objectividade. Também todos sabemos que este credo parte de um antigo complexo de inferioridade que as ciências humanas (e, com particular relevância, as denominadas ciências da educação) possuem relativamente às ciências da natureza e, por isso, à fina força querem-lhes copiar o modelo e o método. 

Mas a realidade é o que é e não se molda a utopias. O ser humano não é um electrão (mesmo com este a física já se vê à nora, quanto mais com o ser humano, que é esta coisa simples que nós sabemos...). E a pedagogia por objectivos deu o que tinha a dar e foi-se. Mas, como todas as modas, há-de regressar mais tarde, retocada aqui e ali...

Ora, a lista horribilis, de algum modo, partilha e vive deste e para este mito. Por isso, discrimina mil e um comportamentos, pretensamente observáveis e objectivos, faz o avaliador colocar um sim ou um não à frente e a coisa está feita.

Foi dado o exemplo da pontualidade como um exemplo a seguir das empresas. Mas há muitas profissões mais exigente que a nossa, cuja a assiduidade e a pontualidade são controladas de 90 em 90 minutos? E sempre foi assim exigente. Ou é preciso vir um engenheiro Fatal falar-nos nisso? Há professores mais surdos que não se dirigem para a sala de aula quando soa o toque da campainha e retardam o início do trabalho? Mas se isso acontece é porque o órgão de gestão não age em conformidade. Ou alguém pensa que esse problema se resolve com listas deste tipo? Alguém pensa que o coordenador vai andar de caneta em punho e de lista na mão a controlar as horas de entrada na sala de aula de todos os professores do seu departamento, para lá colocar um sim ou um não?

Nota final. Estas observações referem-se apenas ao que está subjacente ao modelo teórico de que é filha a lista horribilis, não se referem ao seu conteúdo. Se lá fossemos, então, não sairíamos daqui. E é curioso reparar que, dos 96 itens, não consta um único, (a não ser que com tanto item a «vista já se me tenha baralhado», como dizia o outro), não consta um único, repito, relativo aos conhecimentos científicos do professor!! Conhecimentos científicos que são a base de tudo, ainda que não sejam tudo, pois têm de ser complementados com conhecimentos pedagógicos. Mas é preciso dizer com clareza: sem conhecimentos científicos sólidos tudo o que se faça na sala de aula não passa de uma imensa treta.
Mas isto, ao que parece, não interessa muito a este formador, como também não interessa muito ao modelo de avaliação de desempenho criado pela ministra da Educação.

Avaliação? Que avaliação? Apontamentos para uma troca de ideias – 2.

Dando continuidade ao prometido, começarei por fundamentar a proposição 5 e, posteriormente, a proposição 4, porque foram, até agora, as duas proposições questionadas; a primeira, pela Paula Rodrigues e, a segunda, pelo Pedro Branco.

Proposição 5 : O modelo de avaliação deve ser misto, deve ter uma componente interna e uma componente externa (há a tese contrária, a expressa, por exemplo, no actual modelo de avaliação defendido pela ministra, que tem apenas uma componente interna).

Fundamentação:
A avaliação de desempenho que o ministério gizou assenta exclusivamente num processo de avaliação interna, isto é, uma avaliação feita unicamente pelos pares. Com a excepção do recurso aos resultados obtidos pelos alunos nos exames nacionais para efeitos de avaliação dos professores, não existe qualquer outro elemento externo à escola que intervenha no processo de avaliação (não incluo, aqui, naturalmente, a avaliação que é feita aos avaliadores pela inspecção de ensino).
Defendo que o modelo misto, aquele que combina avaliação interna com avaliação externa, é o mais adequado. Em particular, no que diz respeito à observação de aulas, a avaliação deve ser externa.
A literatura científica sobre esta matéria revela vários aspectos negativos provenientes de uma avaliação interna. Alguns desses aspectos são:
1.º As rivalidades e a concorrência entre colegas são circunstâncias fortemente propiciadoras a um objectivo condicionamento quer da imparcialidade do avaliador quer do comportamento do avaliado. Isto em abstracto. Mas se descermos ao concreto, ao modelo de avaliação criado pela ministra da Educação o problema ainda é mais grave. Vejamos duas situações, entre outras, que este modelo permite:
a) Sempre que um professor não titular for nomeado para assumir as funções de avaliador, no caso de não existir nenhum professor titular no departamento, isso significa que esse professor vai avaliar os colegas com quem directamente compete para ascender, no futuro, a professor titular. Por exemplo, sabe que se atribuir a classificação de excelente ou muito bom está a contribuir para que esses colegas possam passar-lhe à frente e venham a ocupar a vaga de professor titular que ele também pretendia.
b) Sempre que professores no topo da carreira forem avaliados por colegas que estão, na hierarquia profissional, em posição inferior, quer porque têm menor experiência quer porque têm currículo inferior, isso significa que haverá falta de autoridade e de credibilidade profissionais do avaliador perante o avaliado.

2.º A situação pouco confortável em que os pares ficam colocados, quando sabem que a sua avaliação vai determinar a progressão na carreira de colegas com os quais podem ter relações de grande afinidade ou, pelo contrário, de grande antagonismo.

3.º A ausência, na maior parte dos pares, de preparação científica e técnica (que não se adquire em acções de formação de 16 ou de 25 horas...) no domínio da avaliação de desempenho dos professores, o que levanta ponderosas dúvidas sobre a validade e a fiabilidade da avaliação realizada.

(continua a fundamentação da proposição 5 – amanhã, ou depois...)

sábado, 10 de maio de 2008

A lista «horribilis» -1

O INA (Instituto Nacional de Administração) está a vender aos professores um seminário intitulado «A Avaliação do Desempenho do Pessoal Docente», com a duração de 16 horas, cuja 1ª edição vai ter lugar nos dias 12 e 13 de Maio e a 2ª edição 6 e 7 de Junho, nas instalações do instituto, pela módica quantia de 200 euros por participante.
O formador é Jorge Fatal, que apresenta o seguinte currículo:
- Licenciatura em Engenharia de Sistemas Decisionais (Faculdade de Engenharia de Sistemas de Lisboa, 1985);
- Pós-graduação em Marketing - Curso Aberto de Marketing para Executivos (Universidade Católica Portuguesa, 1995);
- MBA (Insead França, 2000);
- Director de projectos em várias organizações internacionais;
- Expert em Liderança e Gestão de Equipas, Gestão do Tempo, Motivação e Gestão da Mudança;
- Consultor e formador em diversas empresas internacionais.
O blogue Terrear, de José Matias Alves, divulgou um documento que, a ser verdade, este formador, Jorge Fatal, apresenta como sendo a forma apropriada de levar à prática a avaliação de desempenho dos professores, em consonância com o estipulado no Decreto Regulamentar 2/2008. Este modelo, composto por 96 itens de resposta sim/não, a que correspondem 96 condutas que os professores deverão ter, permitirá, segundo o próprio, a avaliação automática de cada professor.
Segue-se a lista das 96 condutas.

CONDUTAS
1. É pontual.
2. Disponibiliza-se para actividades que ultrapassam obrigações horárias/profissionais.
3. Cumpre prazos .
4. Quando trabalha em equipa é um elemento participativo e não conflituoso.
5. Zela e preserva material/equipamento escolar.
6. Proporciona ambiente calmo, propício à aprendizagem.
7. Numa reunião tem uma atitude de colaboração e de entreajuda.
8. Manifesta opinião própria e construtiva relativamente a assuntos debatidos.
9. Não gera mau ambiente no local de trabalho.
10. Evita banalidades e perda de tempo.
11. É receptivo à mudança.
12. Dá sugestões / tem opiniões críticas para melhoria de serviços.
13. Faz formação de acordo com o projecto educativo da escola (1/3).
14. Faz formação na sua área específica (2/3).
15. Disponibiliza-se para apoiar os alunos após as horas lectivas, sempre que considere necessário.
16. Regista e avalia o cumprimento das actividades planificadas.
17. Estabelece planos de acção para corrigir desvios.
18. Apoia o desenvolvimento de métodos de aprendizagem / estudo.
19. Estabelece e faz respeitar regras de convivência, colaboração e respeito.
20. Aplica os critérios de avaliação aprovados pelos órgãos competentes.
21. Cumpre o horário - substituir parâmetros de assiduidade
22. Mantém a calma perante uma situação de tensão com alunos, professores ou pais.
23. Mantém limpo e arrumado o local de trabalho.
24. Oferece-se para ajudar em outras áreas que não a sua quando é necessário.
25. Predispõe-se para ajudar as pessoas aquando da necessidade de urgência no serviço
26. Conhece o PE da escola, a missão e a visão da escola.
27. Utiliza correctamente os equipamentos.
28. Verifica o estado dos equipamentos antes e depois da sua utilização.
29. Zela pelo cumprimento do regulamento interno da escola.
30. É educado e cordial com todos os elementos da comunidade escolar
31. Perante uma situação determinada, apresenta diferentes alternativas como solução.
32. Comunica por escrito ao conselho executivo sugestões a implementar (por ex:com base na análise de melhores práticas de outras escolas ou organizações) que ajudam a garantir um serviço de mais qualidade.
33. Mantém a confidencialidade e discrição perante determinadas situações.
34. Recolhe diferentes opiniões ou sugestões procurando criar sinergias com os seus colegas com a mesma função.
35. Colabora / age no sentido de proporcionar um bom clima de escola.
36. Resolve situações de conflito sem ter que solicitar ajuda extra.
37. Assiste a aulas de colegas sempre que considera útil.
38. Permite que outros colegas assistam a aulas suas.
39. Actua de forma rápida e eficaz, de acordo com critérios predefinidos, dentro das acções previstas nos processos de trabalho em que está envolvido
40. Age com assertividade e discernimento, encontrando as soluções mais pertinentes para cada situação, apresentando-as ao respectivo responsável hierárquico.
41. Analisa problemas e toma decisões relativas a rotinas de trabalho, não necessitando de apoio superior.
42. Avalia sistematicamente os resultados que se propõe atingir e formula as actividades para atingir os resultados de forma mais eficaz.
43. Cumpre prazos.
44. Transmite a sua opinião de forma racional e controlada.
45. É receptivo à mudança e envolve os seus pares para melhorar a sua área, a dos outros e a escola no seu todo, não se opondo às questões.
46. Quando é chamado a desenvolver outras actividades, encara sempre a situação de uma forma positiva, predispondo-se para actuar.
47. Revela empenho no desenvolvimento das tarefas, realizando-as antecipadamente.
48. Toma decisões e assume a responsabilidade não jogando a culpa dos problemas para cima de outros.
49. Sugere soluções inovadoras, antecipando a ocorrência de problemas.
50. Gere com eficiência todos os meios existentes na escola.
51. Procura todas as oportunidades de formação de forma a alargar conhecimentos específicos relativos à área da sua intervenção.
52. Propõe actividades com vista à modernização e desenvolvimento da comunidade onde se integra (extravasando os limites da escola).
53. Supera as expectativas do grupo com contribuições activas de desenvolvimento, motivando estes a seguir o exemplo, oferecendo ajuda e dando opiniões construtivas (não havendo rejeições das suas contribuições).
54. Assiste a eventos desenvolvidos por qualquer tipo de entidade.
55. Está ao corrente de situações e dificultades de outras escolas desenvolvendo soluções na escola como prevenção.
56. Perante uma dificuldade na escola conversa com outros colegas que possam partilhar situações similares e sugere determinadas acções.
57. Traz à escola pessoas de assuntos de interesse partilhando experiências.
58. Desenvolve planos de acção para a implementação de melhores práticas pesquisadas e adequadas à escola.
59. Fomenta o networking interno e externo através de comunicações e actividades.
60. Analisa continuamente as tendências dos outros e procura implementar as melhores práticas para encontrar as melhores soluções.
61. Aplica a formação recebida nas tarefas que lhe são atribuídas.
62. Aproveita ideias de outras áreas ou de organizações semelhantes e adapta-as à sua.
63. Avalia sistematicamente os resultados que se propõe atingir e reformula as tarefas, no sentido da melhoria, ou seja, faz alterações ao previsto, para atingir os resultados de forma mais eficaz.
64. Consegue sinergias com outras áreas da organização no sentido de facilitar ou agilizar o serviço.
65. Identifica situações que fogem do padrão do controle previsto e apresenta soluções ao Coordenador no sentido de evitar possíveis problemas.
66. Organiza e coordena actividades consideradas por outras áreas como melhores práticas e incorpora-as com vista à superação dos resultados previamente estabelecidos, apresentando propostas ao Coordenador para superação de objectivos através de um plano
67. Orienta e planeia acções com uma visão partilhada que potencia a missão e os valores da organização.
68. Partilha técnicas, ferramentas e conhecimentos dentro da organização.
69. Partilha técnicas, ferramentas e conhecimentos fora da organização, por exemplo fazendo apresentações em congressos, palestras, etc
70. Partilha técnicas, ideias e recursos melhorando o trabalho em equipa através de aconselhamentos aos seus colaboradores.
71. Predispõe-se para ajudar as pessoas aquando da necessidade de urgência no serviço.
72. Procura todas as oportunidades de formação de forma a alargar conhecimentos específicos relativos à área da sua intervenção.
73. Sempre que verifica alguma anomalia mesmo que não seja da sua área sugere soluções simples mas concretas.
74. Contribui para a mudança planeando melhores práticas e tomando iniciativas, com base em projectos de autonomia e liderança, medindo o grau de satisfação de pelo menos 75% dos seus colaboradores através de pesquisas de satisfação rápidas
75. Apresenta por escrito propostas de soluções novas de problemas fora da sua área de trabalho e de actuação
76. Cria acções novas e motivadoras para a manutenção da disciplina na sala.
77. Cria e implementa novas formas e metodologias que favorecem a participação dos alunos na realização da aula.
78. Cria ferramentas de controle da sua actividade ou de outros dentro da organização que sejam simples mas resolvam os problemas de acompanhamento.
79. Cria instrumentos que proporcionam auto avaliação dos alunos com rigor e objectividade.
80. Cria novos métodos de estudo para os alunos, demonstrando a sua eficácia.
81. Cria novos sistemas ou metodologias nas turmas que estimulam o processo de ensino-aprendizagem.
82. Cria processos e critérios de avaliação e partilha com os avaliados, obtendo consenso e validação.
83. Desenvolve recursos inovadores para a realização de actividades lectivas.
84. É capaz de desenhar condutas observáveis dos colegas avaliados de forma simples e objectiva.
85. Envolve-se em projectos comunitários inovadores por iniciativa própria.
86. Estabelece mecanismos novos de seguimento ou acompanhamentos da implementação dos planos de melhoria negociados com os avaliados.
87. Executa um projecto de liderança inovador e consegue implementar ideias revolucionárias e estratégicas, envolve as pessoas nesses projectos não deixando de fora ninguém.
88. Inova com ideias jamais testadas em algum lado e prova que a organização poderá beneficiar disso.
89. O professor cria e implementa processos claros e reconhecidos pelos alunos para facilitar a sua disponibilidade e apoio aos mesmos.
90. Preocupa-se no desenho e implementação de novas ideias criadas por ele que ajudem a escola na redução do abandono escolar.
91. Propõe novas actividades com vista à modernização e desenvolvimento da comunidade onde se integra.
92. Quando apresenta os problemas apresenta também hipóteses de várias soluções criadas por ele, devidamente estudadas e analisadas e dá a sua opinião de como o problema pode ser resolvido da melhor forma.
93. Sugere novas estratégias para a resolução de problemas
94. Sugere novos critérios que permitam fazer uma análise da planificação e estratégias de ensino para a adaptação ao desenvolvimento das actividades lectivas.
95. Sugere soluções inovadoras, antecipando a ocorrência de problemas.
96. Utiliza os resultados da avaliação dos alunos como base para criar novas formas de actividade lectiva que permitam desenvolver com eficácia e competência as atitudes dos alunos.

Dispenso-me de comentar esta lista horribilis.
Mas é preciso dizer que temos aqui os sinais dos tempos. E que esta lista, se for verdadeira, é filha da mesma mentalidade que produziu o modelo de avaliação imposto pela ministra da Educação. É esta mentalidade e esta moda que agora dominam em Portugal (e, como sempre, com anos de atraso em relação aos países que as produziram): pensar que se pode/deve importar a organização das empresas para a organização das escolas - neste caso, a avaliação atomizada de comportamentos; ainda que, a presente lista ultrapasse, certamente, o que de pior já se faz em algumas empresas.
Que o saber é transdisciplinar é óbvio, que as organizações devem aprender umas com as outras é óbvio, o que não tem nada de óbvio é querer transplantar modelos de um habitat para outro habitat completamente diferente. Uma escola não é uma empresa nem nunca o será, e se um dia o vier a ser já não será escola.
Isto para não falarmos da obrigatoriedade de serem submetidas à discussão duas coisas: o actual e dominante modelo de organização empresarial e o actual e dominante conceito de empresa, tidos pelos experts, acríticos por formação e por vocação, como novos dogmas civilizacionais.
Seduzida por tudo o que é estrangeiro e ávida de protagonismo, a cruzada dos yuppies retardados e da pseudocientificidade educativa está a invadir as escolas e o ensino.
Já tínhamos uma ministra da Educação que não possui uma única obra publicada sobre educação, agora, chegou o momento de termos engenheiros, sem nenhuma formação no domínio da educação, segundo o currículo divulgado, que nos vêm ensinar a realizar a avaliação de desempenho.
E, como era de esperar, da melhor forma.

Pensamentos de Woody Allen

«Se Deus existe, espero que Ele tenha uma boa desculpa.»

«Eu não acredito noutra vida depois desta, mas trago sempre mais um par de cuecas comigo.»


«Eu desejo intensamente voltar para o útero. De quem quer que seja.»

«Não é só o facto de Deus não existir. Experimentem chamar o canalizador num fim-de-semana.»

«O dinheiro é preferível à pobreza apenas por questões financeiras.»

«Se ao menos Deus me mostrasse um sinal forte. Por exemplo, abrir uma conta razoável em meu nome num banco suíço.»

«Eu tenciono colocar a minha esposa sob um pedestal.»

«Imagina se tudo não é mais que uma ilusão e nada existe? Nesse caso já paguei de mais pela minha carpete.»

In A Filosofia Segundo Woody Allen e Manual para Cínicos.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Violência nas escolas?! Quem disse?

Hoje, no Diário de Notícias:

Bullying: Entre 25% e 50% dos estudantes já estiveram envolvidos em conflitos.
Segundo estudos realizados nas escolas portuguesas, entre 25% e 50% dos alunos já estiveram envolvidos, como vítimas ou agressores, em situações de bullying - palavra de origem inglesa utilizada para descrever actos de violência física ou psicológica entre indivíduos do mesmo grupo.

Jovem esfaqueia colega em escola do Cacém.
Um jovem de 18 anos foi esfaqueado, ontem, por um colega de 17 anos, no interior da Escola Secundária Matias Aires.

Apreendidas duas navalhas em escola básica.
Na segunda-feira passada, um jovem de 14 anos ficou ferido numa mão após tentar afastar uma faca, que um amigo lhe apontou ao pescoço [a brincar, dizem]. O caso aconteceu na Escola Básica do Sabugal, distrito da Guarda.

Espero que o procurador-geral da República não tenha a ousadia de falar nestes casos, caso contrário, ouviremos, com certeza, a ministra da Educação, com o ar doído que sempre revela, acusar Pinto Monteiro de alarmista.

Carlos Bica

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Avaliação? Que avaliação? Apontamentos para uma troca de ideias - 1

O prometido é devido. No «Estive quase para comprar o Correio da Manhã (3)» escrevi que passaria, em breve, a partilhar com os nossos bloguistas algumas ideias que defendo sobre a avaliação de desempenho de professores.
A ameaça começa a concretizar-se, hoje. Sou daqueles que pensam que é necessário nós discutirmos não apenas o que não queremos, mas também o que queremos.
Sem periodicidade, apenas ao ritmo da possibilidade, irei deixando, aqui, alguns apontamentos - não são mais do que isso - sobre avaliação de desempenho de professores. Desses apontamentos, uns serão mais ou menos consensuais, outros não o serão, com certeza, e, por isso, fica o convite ao comentário, ao debate, ao exercício do contraditório.

Começo por enunciar algumas proposições de que parto e que, posteriormente, irei fundamentando.

Proposição 1: Deve existir avaliação de desempenho dos professores (há a tese contrária, expressa, por exemplo, por um comentarista chamado Vasco Correia Guedes, mas que utiliza o nome artístico de Vasco Pulido Valente).

Proposição 2: A avaliação deve ser justa, rigorosa e exigente (há a tese contrária, expressa, por exemplo, no anterior modelo de avaliação de desempenho).

Proposição 3: O modelo de avaliação deve ser simples, adequado e centrado nos domínios científico e pedagógico (há a tese contrária, expressa, por exemplo, no actual modelo de avaliação defendido pela ministra, que é gigantesco, burocrata, inoperacional, incompetente e disperso por múltiplos domínios e formalizado em 38 itens de avaliação e 14 de auto-avaliação).

Proposição 4: O modelo de avaliação deve ter uma objectiva componente formativa, complementada com a componente sumativa (há a tese contrária, expressa, por exemplo, no actual modelo de avaliação defendido pela ministra, que tem apenas uma componente sumativa).

Proposição 5: O modelo de avaliação deve ser misto, deve ter uma componente interna e uma componente externa (há a tese contrária, expressa, por exemplo, no actual modelo de avaliação defendido pela ministra, que tem apenas uma componente interna).

Proposição 6: A avaliação de desempenho dos professores deve ser independente das classificações dos alunos (há a tese contrária, expressa, por exemplo, no actual modelo de avaliação defendido pela ministra).

Proposição 7: A concretização de um modelo de avaliação justo, rigoroso e exigente obriga a um prévio plano de formação dos avaliadores, sejam eles internos ou externos (há a tese contrária, expressa, por exemplo, no actual modelo de avaliação defendido pela ministra).

terça-feira, 6 de maio de 2008

A propósito da recente reedição, pela Letra Livre, de «Portugal - Povo de Suicidas», de Miguel de Unamuno

«Viajando por Portugal, teve certa ocasião um amigo meu necessidade de ir ao escritório do gerente do hotel, escritório esse em que havia um cartaz com recomendações aos viajantes escrito em francês, italiano, alemão e inglês. O meu amigo, viajante infatigável, que arranhava alguma coisa de cada uma destas línguas, aproximou-se do gerente e disse-lhe: "Vous parlez français, n'est-ce pas?": ao que ele respondeu: "Não, não falo francês"; e logo: "Lei parla italiano?", e ele: "Não, não falo italiano"; de seguida: "Do you speak english?", "Não, não falo inglês"; e por último "Sprechen sie deutsch?" ao que ele respondeu: "Não, não falo alemão". Diz-lhe o meu amigo então: "Homem, você fala espanhol?", e o português: "Sim senhor, entendo o espanhol". "Pois bem - acrescentou o meu amigo -, diga-me uma coisa, antes de continuar: Você não sabe nem francês, nem italiano, nem alemão, nem inglês, tendo aí uma recomendação nessas quatro línguas, e na única que você, além da sua, parece conhecer, em castelhano, não há nada. Como é isso?" Ao que o português respondeu num castelhano correcto: "Diga-me o senhor em que hotel de Espanha é que viu recomendações ou advertências em português?" O meu amigo calou-se. Mas pude com razão afirmar-lhe que nem lá faz falta o espanhol nem aqui o português, pois nos entendemos bastante bem falando cada qual o seu idioma.
E sendo assim, a que é que se deve este afastamento espiritual e esta tão escassa comunicação de cultura? Creio poder responder-se: à petulante soberba espanhola, por um lado, e à impertinente suspicácia portuguesa, por outro. O espanhol, principalmente o castelhano, é desdenhoso e arrogante e o português, tal como o galego, é receoso e susceptível.»
Miguel de Unamuno, Portugal - Povo de Suicidas

Comentários?

Charles Mingus

A paz necessária a uma guerra inútil - 2

Tudo isso existe e deu sinais há muito, muito tempo. E o que tivemos? Um conflito que se arrasta desde 2005 por causa do Estatuto da Carreira Docente, com momentos de histeria, com o envolvimento de muitos opinadores e da opinião pública em geral, para aparentemente acabar em acordo entre o Ministério da Educação e os sindicatos, acordo que deixa tudo mais ou menos como estava antes de 2005. Esgotámos, uma vez mais, as energias reformistas sem tocar nos problemas de fundo. Pior do que isso é o facto de os erros políticos terem sido tantos, a falta de respeito pela dignidade dos profissionais da educação foi levada a limites quase inimagináveis, que o que pode sobrar é uma maior legitimidade dos professores para resistirem à mudança quando ela era e é indispensável. E quem é responsável por isso? Só falta dizer-se que são os professores de sala de aula que há décadas aturam tudo isto.

O que é evidente desde 2005 é que uma agenda reformista errada imposta unilateralmente pelo governo levou a reboque uma opinião pública e uma opinião publicada durante muito tempo quase acríticas e, até agora, incapazes de mudar o enfoque dessa agenda. O que tem sido ligeiramente diferente em relação à longa história passada é que, por uma vez, não creio que fosse exigível uma outra postura aos sindicatos dos professores. Há muito que sou crítico do movimento sindical, entre outras razões, por sistematicamente extravasar os domínios da sua competência e pela fraca capacidade em mover-se, enquanto força social, com maior autonomia política e financeira. Todavia, isso não resulta apenas da postura do movimento sindical, mas antes da estrutural incapacidade do sistema em separar as questões laborais do corpo docente das outras questões de fundo, aquelas que são verdadeiramente decisivas e que mais afectam a qualidade do trabalho em sala de aula. Há nisso graves responsabilidades por parte dos partidos políticos, no geral incapazes de produzir pensamentos e estratégias consistentes que traduzam a sua visão do sector.

A verdade é que entre 2005 e 2008 os sindicatos dos professores têm actuado naquele que é o seu espaço de maior legitimidade precisamente pela elevada e errada relevância que o governo conferiu às questões laborais. E tanto maior a legitimidade sindical quanto mais o governo socialista recorre a um tipo de actuação com muitos traços impróprios de sistemas de negociação social de uma democracia adulta na qual os seus responsáveis, gostem ou não, devem respeitar as instituições existentes como os sindicatos.

O problemático é ainda não se estar a aproveitar a actual conjuntura para clarificar, por um lado, o que é matéria sindical e, por outro lado, o que é matéria de ensino propriamente dita. A última está relacionada com assuntos que preocupam, em simultâneo, professores, alunos, encarregados de educação, governantes e cidadãos em geral. Para os próprios professores o que pode sobrar para o futuro é continuarem a correr o risco de voltar a ter a pluralidade em que assenta a sua identidade profissional – pela diversidade de origens sociais dos professores; pela diversidade geográfica de onde são naturais; por uns se identificarem tanto com o «país moderno e urbano» e outros com o «país rural e profundo»; pela diversidade de áreas académicas e de níveis de formação; pela diversidade de filiações religiosas, partidárias ou sindicais; pela sua dimensão em número de indivíduos; pela diversidade de interesses e de perspectivas sobre a profissão; entre outras características – o risco é essa diversidade continuar afunilada de modo muito redutor na representatividade sindical. O sindicalismo tem de ser visto apenas como uma entre diversas possibilidades do corpo docente se expressar e ser representado quer junto da tutela, quer tendo em conta a restante imagem pública que os professores transmitem. Seria importante que as mais diversas sensibilidades da classe docente ganhassem formas estruturadas de representatividade, inclusivamente parte delas com aproximações políticas explícitas.

Um dos dramas da educação é não se perceber que a dimensão dos problemas, hoje e no passado, é acima de tudo política e ideológica. Ao omitir-se essa dimensão por uma espécie de obsessão social que vê a cada passo o pecado na política, o resultado é a política acabar por se manifestar no ensino por vias perversas porque encapotadas. Como se a política não pudesse ser uma actividade nobre e como se não percebêssemos que a fragilidade dos partidos políticos não se traduzisse em consequências prejudiciais para a vida de todos nós, dado que essa fragilidade implica o reforço do poder autoritário do Estado e a consequente diminuição do espaço para a nossa liberdade individual. No ensino, a manifestação perversa da política tem surgido, entre outras formas, umas vezes relacionada com conotações ideológicas evidentes naquilo que se designa por «pedagogia» ou por «ciências da educação», outras vezes surge associada ao facto de a tendencial neutralidade da ciência aparecer mesclada com propósitos ideológicos demasiado rasteiros que nada têm do pluralismo próprio de uma democracia. O último aspecto é visível quer nas estruturas curriculares, quer nos programas escolares, quer na forma como eles são transmitidos ou como se processa a avaliação do trabalho dos alunos, quer ainda no tipo de relação professor/aluno que, em maior ou menor grau, condiciona os modelos de conhecimento académico e atitudes cívicas que compete às escolas fomentar.

Se é impossível ser-se politicamente asséptico no ensino (e ainda bem!), pior mesmo é quando não temos (ou fingimos não ter) consciência da intrínseca dimensão política e ideológica das questões da educação. A esse nível, os que merecem maior desconfiança são precisamente aqueles que defendem, por ignorância ou por pressão para a manutenção do statu quo, que na educação não há política ou, pior ainda, defendem que na educação não deve haver política. Essa é uma tentação dos regimes e das
mentalidades pré ou anti-democráticas que em Portugal, no domínio do ensino, se estão a prolongar muito para além do Estado Novo.

Abrir o sistema de ensino ao pluralismo (pedagógico, político, ideológico, ao nível dos modelos de organização institucional), isto é, proporcionar espaço às diversas sensibilidades sociais, significaria ultrapassar décadas em que as políticas educativas têm sido decididas por um trio minúsculo de iluminados assente nos governantes da educação, na elite sindical e nos «cientistas da educação»/«especialistas», com uma ou outra variante como os pretensos representantes dos pais. Gostava que este fosse o momento de romper com esse vício do sistema, dado que o que está em causa acaba por condicionar de forma directa ou indirecta o projecto de sociedade que tem implicações na vida de todos nós.

Termino com uma ideia: os professores de sala de aula (e não os outros, que também os há nas escolas) constituem das classes socioprofissionais mais oprimidas. E quem os oprime não são uns abstractos patrões, mas aqueles que, não trabalhando nas salas de aula, mais enchem a boca com expressões como «defesa da liberdade na escola inclusiva» cujo produto final não tem sido mais do que a menorização da dignidade dos professores.
Gabriel Mithá Ribeiro
Texto enviado por Paula Rodrigues

segunda-feira, 5 de maio de 2008

A paz necessária a uma guerra inútil - 1

Um texto que vale a pena ser lido e discutido.

«O entendimento recente entre o Ministério da Educação e os sindicatos do sector (formalizado a 17.04.2008), em si, não merece comentários de maior. O que preocupa é o facto de, desde que a equipa ministerial dirigida por Maria de Lurdes Rodrigues tomou posse em Março de 2005, as questões laborais do corpo docente – entre elas temas como a assiduidade, a progressão na carreira ou a avaliação dos professores – terem assumido papel central na orientação das políticas educativas. Não se tratando de matérias irrelevantes, é secundário saber se os professores portugueses ganham bem ou mal, se são ou não bem avaliados, se trabalham ou não mais horas na escola por semana do que os outros docentes europeus do ensino não superior. A paranóia nacional reside no facto do sistema ser movido por uma espécie de demência colectiva que sistematicamente sobrevaloriza o acessório e ignora as questões de fundo. É por isso que no ensino temos sido incapazes de encetar transformações profundas.

Para que se saiba, os dois maiores problemas do sector que se arrastam há mais de uma década são a indisciplina e o facilitismo. Sobre eles paira no discurso dos responsáveis (ministeriais, sindicais, gurus ideológico-pedagógicos e classe política em geral) uma tendência esquizofrénica, uma quase negação do real que se vai tornando patológica. E quando a discussão desses problemas emerge, no geral manifesta-se de modo inconsequente ou surge arrastada por questões secundárias que o sistema erradamente transforma em essenciais. É muito difícil provar que as questões socioprofissionais dos professores estão no âmago das fragilidades do sistema de ensino em Portugal. Porém, a experiência de sala de aula prova à saciedade que esse era talvez o último aspecto que deveria preocupar quem não fosse pouco competente ou muito cínico na abordagem das questões educativas.

Será que não se percebe há décadas que a má qualidade das aprendizagens a Matemática, Português, História, Ciências, etc., etc., etc., tem a ver com a indisciplina em sala de aula? Será que não se percebe há muito tempo que um número máximo de quase três dezenas de alunos por turma é um absurdo?
Será que a sociedade portuguesa não tem de ser confrontada com uma discussão sem paninhos quentes sobre o papel estratégico dos exames nacionais em final de ciclo (1º, 2º e 3º) a um número alargado de disciplinas? Será que nos temos de conformar com o contributo para o facilitismo que é a classificação dos resultados escolares com base nos níveis de 1 a 5? Será que temos que aceitar os absurdos curriculares que sobrecarregam os horários dos alunos, consomem parcelas significativas do orçamento para a educação que saem dos impostos pagos por todos nós e que degradam a qualidade do trabalho nas escolas, como a «Área de Projecto», a «Formação Cívica» ou o «Estudo Acompanhado» que fazem parelha com horas avulsas distribuídas em excesso por determinadas disciplinas do secundário? Será que nos temos de conformar com a paranóia que nas últimas décadas hipervaloriza o Português e a Matemática e desvaloriza em excesso disciplinas como a História, as Ciências, a Geografia, a Química e a Física, para já não falar no caso da Filosofia, por parte de quem nos convence da sua pretensa visão integrada da educação? Será que temos de assistir a este esvaziar quase louco do Conhecimento (com «cê» grande)?»
Gabriel Mithá Ribeiro
(amanhã, conclui-se a apresentação deste artigo)

Texto enviado por Paula Rodrigues