terça-feira, 22 de março de 2016

Poemas - Congresso Internacional do Medo


Congresso Internacional do Medo

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio, porque este não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

Carlos Drummond de Andrade


segunda-feira, 7 de março de 2016

O consenso de que não precisamos

Fotografia de Pixel Eye.
Desde há uns meses que a palavra consenso retomou protagonismo na nossa vida pública. 
Primeiro, surgiu associada a um profundo queixume provocado pela sua alegada ausência; agora, nas últimas semanas, surge como um apelo e uma luz orientadora de certas acções.
Foi muito chorada a inexistência de um consenso que tivesse permitido a formação de um governo suportado pelos três partidos que durante décadas formaram o restrito clube do arco da governação (PS-PSD-CDS). Foi muito contestada a opção do PS de se aliar aos partidos da esquerda parlamentar, de modo a recolher apoio para a formação de um governo da sua responsabilidade. Esta opção foi designada de irresponsável. O acordo político PS-BE-PCP-PEV foi mesmo considerado, pelas forças políticas e económicas que têm dominado o regime nas últimas décadas, uma traição ao histórico consenso tripartido do centro-direita (PS-PSD-CDS). As campainhas de alarme soaram.
Na verdade, o desrespeito pelo histórico consenso tripartido ameaça fortíssimos interesses instalados e tem associado a si um perigo maior: o de poder fazer caminho. Isto é, o perigo de poder vir a ser considerado uma alternativa credível às políticas levadas a cabo, durante 40 anos, pelo consenso tripartido do centro-direita. Esta simples possibilidade deixa atemorizados todos aqueles que têm sido defensores e beneficiários desse consenso: protagonistas políticos, financeiros, empresariais e muitos «jornalistas» (os que deixaram de fazer jornalismo, para se tornarem comentadores oficiosos do regime do consenso). É por isso que aqueles que nos últimos quarenta anos sempre defenderam o capital em detrimento do trabalho, aqueles que fizeram o trabalho pagar os crimes e os esbulhos dos banqueiros, aqueles que sempre protegeram a arrogância e a incompetência de patrões que desrespeitam os seus profissionais, aqueles que nutrem um incontido desprezo por pensionistas, reformados e funcionários públicos; todos eles tudo farão, dentro e fora do país (junto da Comissão Europeia, do Conselho Europeu, do Eurogrupo, do Banco Central Europeu), para que o actual governo se estatele, de forma a criarem-se condições para um regresso ao histórico consenso tripartido do centro-direita. E António Costa devia saber disto e devia saber que se esta experiência governativa falhar, por culpa própria ou alheia, será ele o primeiro a ser rapidamente removido do palco político. Não deveria, por isso, tomar a iniciativa de encenar consensos com protagonistas que não só fizeram mal ao país durante décadas, como recentemente tudo fizeram para impedir que o actual governo se formasse. E fizeram-no de modo rasteiro, mesquinho, traiçoeiro.
Na realidade, é incompreensível que António Costa tenha convidado o (ainda) Presidente da República para presidir a um Conselho de Ministros e que, no final, tenha proferido um discurso falso e bajulatório de uma das figuras mais medíocres da actual República.
Alimentar a ideia de que Cavaco Silva foi um político sério, exigente e rigoroso é alimentar uma falsidade. Em vinte anos de poder, a seriedade política esteve quase sempre ausente da sua acção; desde logo, pelo facto de nunca ter tido a seriedade de se assumir como político, mantendo a grotesca encenação de distanciamento da classe política; e, depois, pelo facto do seu trajecto político ter sido feito de permanentes ziguezagues, dizendo e fazendo hoje uma coisa e amanhã o seu contrário, sempre determinado ou pelo oportunismo ou pela mesquinhez ou pelo revanchismo.
Não queremos nem precisamos de consensos destes. Assim como não queremos nem precisamos de regressar ao histórico consenso tripartido do centro-direita, pelo qual o novo presidente, que esta semana toma posse, se irá bater empenhadamente.

quarta-feira, 2 de março de 2016

Manifesto - Associação Nacional de Professores de Educação Visual e Tecnológica




APEVT

Manifesto
(Excerto)

Pela promoção da Educação Artística e Tecnológica na Educação
Básica que vise a formação integral de todos

[...]
Com o objetivo de devolver às escolas e aos alunos, a curto prazo, as condições necessárias ao ensino aprendizagem na Área Artística e Tecnológica, contrariando as tendências decorrentes de uma política que acentuou um ensino centrado na verbalização do conhecimento e nas aprendizagens formalistas e funcionalistas centradas em exercícios / conteúdos com valor e significado em si mesmo, os professores definiram três Domínios de Intervenção Prioritária: 
1. Desenvolvimento curricular
Anulação reorganização do atual modelo do sistema educativo, (Metas Curriculares e Planos Curriculares do Ensino Básico), de modo a garantir uma educação integral para todos, tal como prevê a Constituição da República Portuguesa:
Que permita promover as literacias artísticas e tecnológicas, através da estruturação de modelos disciplinares coerentes, integradores e sequenciais nos três ciclos de estudo;
Que valorize o papel e lugar destas áreas educativas na matriz curricular, pelo aumento da carga horária;
Que garanta a sequencialidade programática entre as Expressões no 1º CEB e a EVT no 2o CEB;
Que anule o retrocesso educativo e as incongruências curriculares no 2º CEB, repondo a disciplina de Educação Visual e Tecnológica;
Que promova as aprendizagens em Educação Tecnológica, no 3º ciclo, com carater obrigatório;
Que garanta o alargamento dos estudos em Educação Tecnológica no Ensino Secundário;
Que elimine a incoerência na transformação curricular de Educação Visual, 3º ciclo, decorrente das Metas Curriculares. 
2. Desenvolvimento socioprofissional Promoção do sentido de profissionalidade docente, evitando a desumanização e intranquilidade do ambiente escolar;
Que reduza o número de alunos por turma possibilitando aos professores perseguirem em melhores condições as finalidades educativas com que atualmente se confrontam;
Que crie equipas curriculares com regimes de docência partilhados para que a escola se
Que torne visível a estabilidade socioprofissional, (a segurança no trabalho, a equidade e clareza na colocação de professores e na distribuição do serviço docente), devolvendo o protagonismo e o reconhecimento que os professores merecem por parte da sociedade. 
3. Programa de acompanhamento e monitorização
A APEVT afirma o seu total empenho na construção de um projeto
educativo sólido e de qualidade para a escola portuguesa, particularmente no que diz respeito à evolução da organização curricular das áreas educativas da Educação Visual/Artes Visuais e Educação Tecnológica.
Neste quadro, defendemos que qualquer alteração passará necessariamente por um processo e modelo que integre as seguintes fases:
Elaboração de uma proposta base;
Discussão pública (auscultação e envolvimento das entidades que
trabalham estas áreas);
• Programa de experimentação, acompanhamento, apoio e monitorização; •Formação/atualização da formação contínua de professores;
• Plano de implementação (monitorização e avaliação com desenvolvimento de dispositivos de regulação).