quarta-feira, 18 de abril de 2012

Às quartas

O NAHUAL

Estou triste
Os meus olhos ocultos perderam-se já sem lágrimas
Sob o mate escuro
A fugir do sol.

Quando acompanhei o feiticeiro ao monte
à procura de um nahual para proteger
os meus passos no mundo
nenhum animal quis aproximar-se para me adoptar
nem a cotovia
nem a anta — silenciosa sombra dos rios —
nem o coati
nem o javali

E agora que o meu coração amadureceu
E palpita forte sob a pele
Sinto que é hora de ter filhos — rebentos da carne —
O mel conquista o trémulo leito da mulher febril

Por isso estou aqui nesta solidão
E esgotei os músculos a saltar
A correr furioso como um louco
A invocar o sonho entre sopros.

Não desejara o abismo ou o lagarto
A lenta tartaruga sagrada, ou qualquer serpente.

Sou altivo, e nobres são o rosto e o coração
Que conservo para os deuses.

Roque Dalton
(Trad.: Jorge Henrique Bastos)