quinta-feira, 30 de abril de 2009

O Ministério da Educação incentiva alunos à delação

Vários meses depois de Maria de Lurdes Rodrigues ter sido alvo de uma chuva de ovos, um inspector da Inspecção Geral de Educação foi à Escola Secundária de Fafe e levou uma aluna, de 16 anos, para uma sala, que não conhecia, para ser interrogada sobre esse acontecimento durante cerca de uma hora, segundo notícia o Público, na sua edição de ontem. O pai da aluna, e presidente da associação de pais, afirma que a sua filha «foi incitada a acusar e denunciar pessoas, nomeadamente os seus professores, pelos quais se espera que tenha respeito como figuras de autoridade.»
A ser verdade, este é mais um exemplo da medíocre e perigosa mentalidade que governa o nosso país. É a mentalidade inquisitorial, é a mentalidade da ameaça mais ou menos velada, é a mentalidade da intimidação. Este Ministério da Educação, pelo exemplo da sua acção, deseduca, malforma. Estimular um aluno a ser delator é grave, é gravíssimo. E não é apenas ser delator, é ser delator de alguém com quem se tem uma relação especial, de proximidade, de afecto e, simultaneamente, de autoridade, como salienta, e bem, o pai da aluna.
O denunciante é, deste modo, apresentado aos jovens como o paradigma ético, como a referência moral. É isto que o Ministério da Educação ensina: acusar o amigo, acusar o professor é correcto, como será correcto acusar o pai ou a mãe. O Ministério da Educação não olha a meios para atingir os seus fins, e isto é, exactamente, outra coisa que ele ensina: os fins justificam os meios.
Já tinha, enquanto professor, a pior opinião possível acerca da qualidade técnica e política deste Ministério da Educação. Agora, enquanto pai, tenho o Ministério da Educação, pelos valores que emana e pelos comportamentos que induz, como uma instituição perniciosa para a educação do meu filho. Agora, enquanto pai, vejo-me na obrigação de alertar permanentemente o meu filho para não seguir os maus exemplos comportamentais do Ministério - do Ministério que, precisamente, deveria ter a incumbência de o co-ensinar, entre outras coisas, a ser um cidadão responsável com elevados padrões éticos. Enquanto pai, tenho, neste momento, o Ministério da Educação como uma má companhia, como uma nefasta influência para o meu filho.
É muito grave chegar-se a este ponto.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Às quartas

Último Soneto

Que rosas fugitivas foste ali:
Requeriam-te os tapetes - e vieste...
- Se me dói hoje o bem que me fizeste,
É justo, porque muito te devi.

Em que seda de afagos me envolvi
Quando entraste, nas tardes que apareceste -
Como fui de percal quando me deste
Tua boca a beijar, que remordi...

Pensei que fosse o meu o teu cansaço -
Que seria entre nós um longo abraço
O tédio que, tão esbelta, te curvava...

E fugiste... Que importa? Se deixaste
A lembrança violeta que animaste,
Onde a minha saudade a Cor se trava?...

Mário de Sá-Carneiro

terça-feira, 28 de abril de 2009

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Notas do fim-de-semana


TPC para Sócrates
«Na RTP, Judite de Sousa e José Alberto Carvalho foram vítimas de bullying socrático. Sócrates abusou de uma atitude autoritária, revelando o seu pouco à-vontade para lidar com perguntas. Alé disso, Sócrates deveria ler "Areopagítica - Discurso sobre a Liberdade de Expressão" (Almedina). Este clássico de John Milton tem ainda muito a ensinar a políticos que procuram proteger a sua actividade pública com um suposto 'bom nome' provado. Quem é que Sócrates julga que engana quando diz que não está a processar "jornalistas", mas sim "pessoas" que o difamaram?»
Henrique Raposo, Expresso (25/4/09)

Jovens têm de estudar até aos 18 anos
mas podem trabalhar com 16 anos

O Governo quer alargar a escolaridade obrigatória em mais três anos, mas, de acordo com economistas e especialistas em Direito do Trabalho, pode tornar "obsoletas" várias disposições da legislação laboral e poderá mesmo deixar sem fundamento a idade mínima de admissão ao trabalho (16 anos).
Público (25/04/09)

Pode haver uma deriva totalitária em Portugal?
«A substituição do debate pelo marketing, a cedência à espectacularização da vida política, a substituição do conteúdo pela forma, é caldo de cultura para uma despolitização anómica da democracia, que propicia o adormecimento cívico.»
José Pacheco Pereira, Público (25/04/09)

Sol e Sombra
«João Tiago Silveira, secretário de Estado da Justiça, veio pressurosa e tolamente, condenar a Ordem dos Notários e considerar "uma situação muito grave" esta facilitar o acesso a jornalistas de documentos notariais relativos a Sócrates e a outros envolvidos no caso 'Freeport'. Documentos públicos e de livre acesso público, sublinhe-se. A censura e a intimidação socratistas já chegaram a este ponto e com tal desfaçatez?! É o Estado de Direito antidemocrático em todo o seu esplendor...»
José António Lima, Sol (24/04/09)

O ovo da serpente-01

Os bons e os maus
«Já há mais jornalistas a contas com a justiça por causa do Freeport do que houve acusados por causa da queda da ponte de Entre-os-Rios. Isto diz muito sobre a escala de valores de quem nos governa.
Chegar aos 35 anos do 25 de Abril com nove jornalistas processados por notícias ou comentários com que o Chefe do Governo não concorda é um péssimo sinal. O Primeiro-ministro chegou ao absurdo de tentar processar um operador de câmara mostrando que, mais do que tudo, o objectivo deste frenesim litigante é intimidar todos os que trabalham na comunicação social independentemente das suas funções, para que não toquem na matéria proibida. Mas pode haver indícios ainda piores. Se os processos contra jornalistas avançarem mais depressa do que as investigações do Freeport, a mensagem será muito clara. O Estado dá o sinal de que a suspeita de haver membros de um governo passíveis de serem corrompidos tem menos importância do que questões de forma referentes a notícias sobre graves indícios de corrupção. Se isso acontecer é a prova de que o Estado, através do governo, foi capturado por uma filosofia ditatorial com métodos de condicionamento da opinião pública mais eficazes do que a censura no Estado Novo porque actua sob um disfarce de respeito pelas liberdades essenciais. Não havendo legislação censória está a tentar estabelecer-se uma clara distinção entre "bons" e "maus" órgãos de informação com advertências de que os "maus" serão punidos com inclemência. O Primeiro-ministro, nas declarações que transmitiu na TV do Estado, fez isso clara e repetidamente. Pródigo em elogios ad hominem a quem não o critica, crucifica quem transmite notícias que lhe são adversas. Estabeleceu, por exemplo, a diferença entre "bons jornalistas", os que ignoram o Freeport, e os "maus jornalistas" ou mesmo apenas só "os maus", os que o têm noticiado. Porque esses "maus" não são sequer jornalistas disse, quando num exercício de absurdo negou ter processado jornalistas e estar a litigar apenas contra os obreiros dos produtos informativos "travestidos" que o estavam a difamar. E foi num crescendo ameaçador que, na TV do Estado, o Chefe do Governo admoestou urbi et orbi que, por mais gritantes que sejam as dúvidas que persistem, colocar-lhe questões sobre o Freeport é "insultuoso", rematando com um ameaçador "Não é assim que me vencem". Portanto, não estamos face a um processo de apuramento de verdade. Estamos face a um combate entre noticiadores e noticiado, com o noticiado arvorando as armas e o poder que julga ter, a vaticinar uma derrota humilhante e sofrida aos noticiadores. Há um elemento que equivale a uma admissão de culpa do Primeiro-Ministro nas tentativas manipulatórias e de condicionamento brutal da opinião pública: a saída extemporânea de Fernanda Câncio de um painel fixo de debate na TVI sobre a actualidade nacional onde o Freeport tem sido discutido com saudável desassombro, apregoa a intolerância ao contraditório.
Assim, com uma intensa e pouco frequente combinação de arrogância, inabilidade e impreparação, com uma chuva de processos, o Primeiro-Ministro do décimo sétimo governo constitucional fica indelevelmente colado à imagem da censura em Portugal, 35 anos depois de ela ter sido abolida no 25 de Abril.»
Mário Crespo - Jornal de Notícias

domingo, 26 de abril de 2009

Afinal, era tudo mentira: os Xutos gostam de Sócrates

Fiquei ontem a saber que, afinal, era tudo mentira: uma tal banda de nome Xutos & Pontapés, autora de uma música que, segundo me disseram, está muito em voga, de nome Sem Eira Nem Beira, e onde se fala constantemente num tal «senhor engenheiro» e em «enganar o povo que acreditou» e que «esta merda vai mudar» e expressões um pouco mais hard (fui ouvir a música e é verdade que diz isso e muito mais), nunca teve em mente criticar o engenheiro José Sócrates. Nunca. Declaram-no com todas as letras e com toda a falta de vergonha, na edição desta semana do Sol. Um dos membros dessa banda, de sua graça Zé Pedro, diz mesmo: «Não queremos ser embrulhados em coisas políticas» e «eu gosto muito do Sócrates».
Portanto, aquela coisa, na letra da canção, de «senhor engenheiro» para a frente e «senhor engenheiro» para trás foi coincidência, não tem nada que ver com o engenheiro José Sócrates, primeiro-ministro do Governo de Portugal. A outra coisa que por lá se ouve de «enganar o povo que acreditou» não só não se relaciona minimamente com o engenheiro Sócrates como não tem nada que possa ser ligado com o embrulho da política. Finalmente, a parte que diz «esta merda vai mudar» também não tem qualquer relação com a tal política nem com o tal engenheiro, é mesmo tão só e apenas uma coisa escatológica.
Quanto ao declarado gosto que manifestam por Sócrates, devemos ter presente que é, obviamente, uma apreciação pessoal ou estética ou afectiva ou de outra índole qualquer, mas não política.
Isto levanta um problema, porque a única utilidade que aquela música poderia ter era mesmo ser uma crítica política, mas como, pelos vistos, não é, então, não tem serventia nenhuma. A música é péssima e a letra, ficamos agora a saber, é ininteligível. Serve então para quê? Para ouvir não é, certamente.
Veio-me agora à memória um antigo programa da rádio. Esse programa tinha uma rubrica de crítica diária a toda a música xunga que fosse editada. O locutor, depois de passar à lupa a mediocridade da letra e da música da canção, encerrava a crítica sempre com a mesma frase: «Este disco é intocável, mas de certeza que não é inquebrável», e depois partia-o.
Claro que foi uma mera coincidência ter-me lembrado disto, não tem nada que ver com o tal disco do grupo dos pontapés...

Pensamentos de domingo

«Quem votou num político pró-aborto como Barack Obama deve abster-se de receber a comunhão até que se reconcilie com Deus.»
Jay-Scorr Newman, padre na Carolina do Sul, Sol.

«A melhor coisa para um jogador de futebol é arranjar uma boa mulher.»
Luiz Filipe Scolari, The Mail on Sunday.

«Eu sou a prova viva de que as loiras não são burras»
Paris Hilton, actriz, Contigo!

Kenny Garrett

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Professores da Esc. Sec. D. João V (Damaia) aprovaram greve às avaliações

Helena Feliciano enviou-nos esta informação:
«Os Professores da Escola Secundária D. João V, na Damaia, Amadora, em reunião sindical, aprovaram a seguinte proposta:
- Greve às reuniões de Conselho de Turma de avaliação no terceiro período nos anos em que há exames: 9º, 11º e 12º anos, rotativamente, apenas com um professor de cada vez.
Aprovou-se igualmente a proposta de criação de um fundo de greve para diluir os prejuízos em vez de penalizar só alguns professores.»

Doze anos de escolaridade vezes cinco

Independentemente dos méritos e dos deméritos que o alargamento da escolaridade obrigatória para doze anos possui, há um facto incontornável: esta medida já foi anunciada solenemente, no mínimo, cinco vezes, por José Sócrates:
1ª vez - na campanha eleitoral, em 2005;
2ª vez - no programa do governo, aprovado pela Assembleia da República;
3ª vez - há poucos meses, aquando da chamada de atenção do Presidente da República para essa questão;
4ª vez - no congresso do Partido Socialista, realizado recentemente, que serviu para anunciar a recandidatura de Sócrates a primeiro-ministro e as suas propostas para a próxima legislatura;
5ª vez - no último Conselho de ministros.
Isto é, uma medida que ainda não teve nenhuma concretização na realidade escolar de ninguém, que ainda não serviu para coisa alguma já foi anunciada, divulgada, publicitada, no mínimo, cinco vezes e sempre como se fosse a primeira vez.
Já foram ultrapassados os quatro anos da legislatura, ou seja, o tempo normal de duração de um Governo (recordo que José Sócrates vai ter mais meio ano de governação que todos os Governos anteriores) e que realidade temos? A realidade objectiva, indiscutível é, neste domínio como em muitos outros, igual a zero, é igual a nada. Contudo não parece. Parece que estamos, neste domínio como em muitos outros, perante um Governo dinâmico que está sempre em movimento, que está sempre a fazer coisas, que está sempre a tratar de nós, que só pensa em nós, que faz tudo por nós.
Desta forma, é justo reconhecer que, comparativamente com a eficácia da gigantesca encenação socrática, qualquer dos conhecidos milagres, por exemplo, o milagre da multiplicação do pão, não é mais que um simples prolegómeno à arte da prestidigitação. Ao contrário do milagre dos pães, e de outros, Sócrates opera milagres a partir do nada. Multiplica o nada por nada, anuncia, anuncia, anuncia e faz-nos crer que gera obra.
Agora, foi a vez dos doze anos de escolaridade obrigatória; em Fevereiro, foi o anúncio, pela quarta vez, do início das obras de construção do IP8; no final do ano passado, foi a encenação com os Magalhães que foram entregues aos alunos para as televisões filmarem e, logo que concluída a sessão de marketing, rapidamente rapinados das mãos das crianças e volvidos à procedência; há seis meses...
Podemos até admitir que Deus quer e que certamente Sócrates sonha, mas a verdade é que, com ele, a obra raramente nasce.

Professores da Esc. Sec. Manuel Cargaleiro aprovam greve de uma semana e manifestação nacional

quinta-feira, 23 de abril de 2009

A propósito de processos

«Parece que a exibição, pela TVI, do vídeo em que o sr. Charles Smith chama "corrupto" e "estúpido" ao eng. Sócrates levou o eng. Sócrates a processar o director da estação, a pivô do noticiário que transmitiu o vídeo, os dois jornalistas que assinaram a peça alusiva e o operador de imagem que, na Inglaterra, filmou a fachada da instituição que investiga o caso Freeport.
[...] Ao que consta, também falta processar o sr. Charles Smith, mas isso é o menos.»
Alberto Gonçalves, Sábado (23/04/09)

A propósito de recados

«[...] Recebi com particular atenção as declarações de Sócrates, segundo o qual o País não precisa da política do recado. O problema é que, quando diz que Portugal dispensa a política do recado, Sócrates está, infelizmente, a dar um recado - que, ao que parece, é precisamente aquilo que Portugal dispensa.»
Ricardo Araújo Pereira, Visão (23/4/09)

José Eduardo Moniz processa Sócrates

A declaração pública do director da TVI pode ser vista aqui.

A propósito de cartazes vergonhosos

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Professores da Esc. Sec. de S. Pedro (Vila Real) aprovam greve de uma semana seguida de manifestação

Octávio Gonçalves, do PROmova, enviou-nos esta informação:
«Os professores da Escola Secundária de S. Pedro, em Vila Real, aprovaram, em reunião sindical, as formas de luta a serem implementadas no decurso do 3.º período lectivo e, especificamente, durante o mês de Maio.
Sublinhando a necessidade de revogação incondicional da divisão administrativa, arbitrária e injusta, da carreira e rejeitando este modelo de avaliação, qualquer que seja a versão, os professores da S. Pedro aprovaram formas de luta a doer, no sentido de se forçar o ME a adoptar uma atitude sensata e construtiva que permita repor a tranquilidade, a seriedade e a justiça nas escolas, enquanto requisitos indispensáveis à abertura de um verdadeiro processo negocial. Em conformidade, foram aprovadas as duas seguintes formas de luta:
1) Greve de uma semana, em que cada professor fará dois dias de greve, sendo um dia por região, a culminar numa sexta-feira de greve nacional, com uma grande manifestação nesse mesmo dia.
2) Mandatar a Plataforma Sindical e os Movimentos para estabelecerem contactos com os partidos políticos da oposição, no sentido de, ainda antes das eleições europeias, se poder estabelecer um "Compromisso Educação" que, no essencial, traduza um acordo com vista à revogação da divisão administrativa da carreira e à substituição deste modelo de avaliação.

Um abraço a todos os professores que, estamos certos, não baixarão os braços, num momento decisivo.»

Às quartas


E por vezes


E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos

David Mourão-Ferreira

terça-feira, 21 de abril de 2009

Prognósticos para uma entrevista anunciada

Hoje à noite, o primeiro-ministro vai ser entrevistado na RTP1, pela jornalista Judite de Sousa. Entretanto, foi anunciado pelo gabinete do chefe do executivo que será aí que vai ser dada a resposta à questão que tem afligido os portugueses:
- quando José Sócrates afirmou que «o país não precisa, neste momento, da política do recado, do remoque, do pessimismo, do bota-abaixo ou da crítica fácil», estava ele a responder ao presidente da República (que no dia anterior havia dito: «seria um erro muito grave, verdadeiramente intolerável, que, na ânsia de obter estatísticas económicas mais favoráveis e ocultar a realidade, se optasse por estratégias de combate à crise que ajudassem a perpetuar os desequilíbrios sociais já existentes ou que hipotecassem as possibilidades de desenvolvimento futuro e os direitos das gerações mais jovens»)?
Terá o primeiro-ministro respondido, desta forma grosseira e directa, ao presidente da República? Sim ou não? Toda a gente sabe que sim. Mas também não é difícil de prognosticar que Sócrates vai dizer que não. Será mais ou menos assim:
Judite de Sousa:
- Senhor primeiro-ministro, quando há dias disse que
o país não precisava «da política do recado» estava a responder ao senhor presidente da República?
José Sócrates, com ar condoído, vitimizado, sofrido, responde:
- Judite de Sousa, a Judite de Sousa sabe que nunca verá, da parte do primeiro-ministro, qualquer iniciativa de guerrilha institucional ou até de crítica pública ao senhor presidente da República. Nunca o verá, pode estar certa disso, Judite de Sousa. Absolutamente certa. Mas, já que me faz essa pergunta, aproveito para esclarecer, e para desiludir aqueles que desejariam ver conflitos entre diferentes órgãos de soberania, que aquilo que eu afirmei nunca poderia ser dirigido ao senhor presidente da República. E não poderia ser dirigida ao senhor presidente da República por uma razão muito simples: eu não entendi nem entendo que as palavras do senhor presidente da República tivessem sido dirigidas ao Governo. E acrescento, Judite de Sousa, que eu próprio subscrevo integralmente a mensagem que o senhor presidente da República quis endereçar a todos. Eu sou o primeiro a subscrevê-la, pode estar certa disso. E eu e o meu Governo temos feito tudo para que isso assim aconteça.

Vai uma aposta?

Professores da Esc. Sec. de Amora aprovam greve de uma semana e manifestação nacional

Texto aprovado, hoje, pelos professores da Escola Secundária de Amora, presentes na reunião de consulta geral promovida pelos plataforma sindical:

1) Marcação de uma greve de uma semana, a ocorrer no mês de Maio, em que cada professor fará dois dias de greve (um dia por região ou por departamento curricular, a culminar numa sexta-feira de greve nacional, com uma grande manifestação, em Lisboa, nesse dia).

2) Realizar, até ao final do ano lectivo, uma campanha diária junto dos órgãos de comunicação social, promovida pelos sindicatos, pelos movimentos independentes e blogues, que revele de modo objectivo as ilegalidades, as inconstitucionalidades, as injustiças, as inconsistências e a incompetência da legislação produzida por este Ministério da Educação.

3) Se, até 5 de Junho, o M.E. não suspender o incompetente modelo de avaliação de desempenho, se não acabar com a divisão da carreira e com os sistemas de quotas, devem ser marcados novos períodos de greves (por regiões) a todo o trabalho docente, a ocorrer durante o meses de Junho e Julho.

4) Estabelecimento de contactos com os partidos políticos da oposição, no sentido de, antes das eleições europeias, se poder estabelecer um "Compromisso Educação" que, no essencial, traduza um acordo com vista à revogação da divisão administrativa da carreira e à substituição deste modelo de avaliação.

Bonecos de palavra

Para ver em tamanho normal, clicar em cima da imagem.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Comunicado conjunto da APEDE, do MUP e do PROmova

"A luta depende muito daquilo que os professores estiverem dispostos a fazer e dos compromissos que assumirem face às acções a desenvolver."

Esta foi a afirmação dos dirigentes da Plataforma Sindical quando foi marcada, para esta semana, uma consulta geral nas escolas.

Infelizmente, esta consulta ameaça tornar-se numa "consulta", se não estivermos atentos e não soubermos introduzir na discussão TODOS os pontos de vista e propostas. TODOS mesmo!

Está a ser apresentada, nas reuniões já ocorridas hoje, uma MOÇÃO, aprovada pela Plataforma Sindical (podem encontrá-la no site da FENPROF) que merece, da nossa parte, movimentos independentes de professores, nomeadamente a APEDE, o MUP e o PROmova, uma reacção de forte repúdio e firme denúncia. Após o Encontro de Professores em Leiria, tivemos o cuidado de reunir com alguns sindicatos da Plataforma para solicitar que esta consulta, aos professores, fosse totalmente aberta e não condicionada. Nos últimos dias, na blogoesfera, repetimos VINCADAMENTE esse apelo.

Uma MOÇÃO redigida e apresentada nestes termos (chamamos a atenção particular para o 4º ponto, a contar do final, e para a ausência total de referência a formas de luta mais contundentes) não nos parece de todo correcta, dado que é inequivocamente redutora e parcial. Aponta um caminho, que deixa claramente subentendido, e exclui todos os outros. Não nos parece que promova e que seja o garante de um debate plural e enriquecedor em torno das diversas formas de luta passíveis de serem adoptadas.

Aliás, o simples facto de as organizações sindicais levarem para as reuniões nas escolas uma moção previamente cozinhada, que condiciona todo o debate, fechando-o à partida, parece-nos profundamente negativo e revela que as más práticas do passado tendem a perpetuar-se sem que os seus actores retirem as devidas lições de erros mil vezes cometidos.

Acima de tudo, colegas, quer concordem ou não com esta MOÇÃO, apresentada pela Plataforma Sindical, não deixem de intervir! Durante as reuniões, discutam tudo, proponham, escolham, ponderem, votem. É esse o grande apelo que fazem os movimentos independentes de professores! É fundamental que saibamos sair do "cerco" e que discutamos abertamente TODAS as hipóteses de luta, TODAS as opções, TODOS os caminhos, mesmo que só nos apresentem um!
Vamos a isso!

Professores do Agrup. Escolas D. Carlos I (Sintra) aprovam greve de uma semana e manifestação nacional

Ricardo Silva, da APEDE, enviou-nos esta informação:

«Aqui ficam os resultados da reunião sindical de hoje na minha escola.
Acções de luta aprovadas sem qualquer voto contra:
1. Greve por uma semana* seguida de manifestação nacional;
2. Publicação nos jornais de um comunicado/anúncio, de página inteira, no dia da manifestação, explicando à opinião pública as razões da luta dos professores,
3. Caso a greve prolongada e a manifestação não façam recuar o ME, deve ser organizada uma greve às avaliações do 3º período, responsabilizando-se directamente o ME pelas consequências negativas que daí possam advir para os alunos.

*Feita nos moldes defendidos pelos movimentos independentes de professores (nessa semana cada colega só faz dois dias de greve: um por departamento curricular ou região e outro na greve geral).»

Sugestões do Movimento PROmova, no quadro da Consulta Geral

PROmova.jpg

Os professores identificados com o Movimento PROmova participarão nestas reuniões e defenderão as seguintes formas de contestação no decurso do 3º período lectivo:

1) marcação de uma greve de uma semana, em que cada professor fará dois dias de greve (um dia por região, a culminar numa sexta-feira de greve nacional, com uma grande manifestação nesse mesmo dia);

2) estabelecimento de contactos com os partidos políticos da oposição, no sentido de, ainda antes das eleições europeias, se poder estabelecer um "Compromisso Educação" que, no essencial, traduza um acordo com vista à revogação da divisão administrativa da carreira e à substituição deste modelo de avaliação;

3) organização de vigílias/concentrações por tempo indeterminado, em cada capital de distrito, dinamizadas, rotativamente, pelos professores resistentes de cada distrito, permitindo o recurso a intervenções/acções multimédia que mostrem as inconsistências e as injustiças desencadeadas pelas medidas educativas deste Governo, podendo, inclusive, incorporar um apelo à não votação no PS de Sócrates;

4) garantia de apoio jurídico aos professores que, em coerência com os seus princípios, não participem em nenhum acto relacionado com este modelo de avaliação e, em conformidade, não entreguem a Ficha de Auto-avaliação, substituindo-a por um Relatório Crítico.

Neste sentido, o PROmova incentiva os professores e educadores a proporem estas estratégias de actuação, de modo a que a Plataforma Sindical se possa envolver, de forma determinada, na sua consecução.

Além destas propostas de acção, o PROmova apela a todos os professores e educadores para que se mantenham intransigentes na não aceitação da divisão da carreira e na rejeição deste modelo de avaliação.

PROmova

Consulta Geral

Finalmente!

Notícia retirada do sítio do Jornal de Notícias (20/4/09):

«Deputados da Oposição, do BE ao CDS-PP, uniram-se para subscrever um pedido [ao Tribunal Constitucional] de fiscalização sucessiva do modelo simplificado de avaliação, que se encontra em vigor, e o documento deverá ser entregue até sexta-feira.»

Notas do fim-de-semana

O Presidente da República disse:
«Seria um erro muito grave, verdadeiramente intolerável, que, na ânsia de obter estatísticas económicas mais favoráveis e ocultar a realidade, se optasse por estratégias de combate à crise que ajudassem a perpetuar os desequilíbrios sociais já existentes ou que hipotecassem as possibilidades de desenvolvimento futuro e os direitos das gerações mais jovens.[...]

Acresce que, num cenário de dificuldades, e sob a pressão da necessidade urgente de agir, as decisões nem sempre são ponderadas devidamente, acabando por abrir espaço para o desperdício de recursos públicos ou para a concentração desses recursos nas mãos de uns poucos, precisamente aqueles que detêm já maior influência junto dos decisores..[...]

Não se trata de governar para os números, nem para as estatísticas. Estão em causa problemas concretos de natureza social, que geram situações de desespero e afectam com especial gravidade os mais desprotegidos. [...]

Não podemos desperdiçar recursos em respostas que mais não fazem do que deixar tudo na mesma ou tornar ainda mais apertado o caminho do nosso desenvolvimento futuro. [...]»

Excertos do discurso do Presidente da República na Sessão de Abertura do 4º Congresso da Associação Cristã de Empresários e Gestores (ACEGE), Lisboa, 17 de Abril de 2009, in Página Oficial da Presidência da República.

José Sócrates disse:
«O país não precisa, neste momento, da política do recado, do remoque, do pessimismo, do bota-abaixo ou da crítica fácil.»

Excerto do discurso de José Sócrates no Fórum Novas Fronteiras, em Lisboa, em 18 de Abril, in todos os órgãos de comunicação social.

domingo, 19 de abril de 2009

Pensamentos de domingo

«Um político [profissional] divide os seres humanos em duas classes: instrumentos e inimigos.»
Nietzsche

«Aquele homem deve ser um grande ignorante, ele responde a tudo o que lhe perguntamos.»
Voltaire

«As mulheres devem ser completamente iguais aos homens, mas de preferência um pouco decotadas.»
Red Top
In José Manuel Veiga, Manual para Cínicos.

Louis Hayes, Yusef Lateef, Barry Harris, Sam Jones e Nat Adderley

sábado, 18 de abril de 2009

Ao sábado: momento quase filosófico


Acerca do Método Científico - 2 (conclusão)
«O triunfo do empirismo na epistemologia ocidental reflecte-se no facto de presumirmos automaticamente que é o método de verificação que todas as pessoas usam:
Três mulheres estão num balneário a equipar-se para jogar ténis quando um homem entra a correr todo nu, apenas com um saco na cabeça.
A primeira mulher olha para o pénis do homem e diz:
- Bem, não é o meu marido.
A segunda mulher diz:
- Pois não.
A terceira diz:
- Nem sequer é membro deste clube.
No entanto, apesar do triunfo do empirismo e da ciência, muitas pessoas continuam a interpretar alguns acontecimentos invulgares como milagrosos e não como o resultado de causas naturais. David Hume, o empirista céptico britânico, declarou que a única base racional para acreditar que alguma coisa é um milagre é se todas as explicações alternativas forem ainda mais improváveis.
Digamos que um homem insiste que tem uma palmeira num vaso que canta árias da Aida. O que é mais improvável: que a palmeira no vaso violou as leis da natureza ou que o homem é doido, ou está a mentir ou a alucinar [...]?
Como as probabilidades de o homem ter sido enganado ou ter esticado a verdade são sempre maiores do que as probabilidades de uma violação das leis da natureza, Hume não conseguiu prever uma circunstância em que fosse racional concluir que tinha acontecido um milagre.
Curiosamente, na história seguinte, Bill, um aparente estudioso de Hume, põe à prova um suposto milagre, mas acaba por chegar à conclusão de que a explicação alternativa é ainda mais improvável:
Um dia, Bill queixou-se ao amigo de que lhe doía imenso o cotovelo. O amigo sugeriu-lhe que fosse visitar um swami que vivia numa gruta ali perto.
- Deixa simplesmente uma amostra de urina do lado de fora da gruta e ele medita nela, diagnostica milagrosamente o teu problema e diz-te o que poderás fazer para resolvê-lo. Custa apenas dez dólares.
Bil pensou que tinha pouco a perder, por isso encheu um frasco com urina e deixou-o do lado de fora da gruta com uma nota de dez dólares. No dia seguinte, quando regressou, havia um bilhete à sua espera que dizia: "Tens uma cãibra no cotovelo devido ao ténis. Mergulha o braço em água morna. Evita levantar pesos. Vais melhorar dentro de duas semanas."
Mais tarde nessa noite, Bill começou a pensar que o "milagre" do swami era uma encenação preparada pelo amigo, que podia ter escrito o bilhete e tê-lo deixado do lado de fora da gruta. Assim, Bill decidiu vingar-se do amigo. Juntou um pouco de água da torneira, fezes do cão e amostras de urina da mulher e do filho. Para rematar, incluiu outro fluido corporal seu e deixou a mistura do lado de fora da gruta juntamente com uma nota de dez dólares. Em seguida, ligou para o amigo e disse-lhe que estava com alguns problemas de saúde e que tinha deixado outra amostra para o swami.
No dia seguinte, voltou à gruta e encontrou outro bilhete que dizia: "A tua água canalizada é muito calcária. Arranja um amaciador para a água. O teu cão tem lombrigas. Dá-lhe vitaminas. O teu filho está viciado em cocaína. Interna-o num centro de desintoxicação. A tua mulher está grávida de duas meninas gémeas. Não são tuas. Arranja um advogado. E se não parares de te masturbar, a cãibra do cotovelo nunca mais melhorará."»
Thomas Cathcart e Daniel Klein, Platão e um Ornitorrinco Entram num Bar...

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Governo acaba com as quotas para titular se...

Retirado do sítio do Público (16/04/09):
«O Governo admite prescindir do número limitado de vagas para acesso à categoria de professor titular se os sindicatos puserem fim ao clima de contestação dos últimos tempos, disse hoje o secretário de Estado Jorge Pedreira.»

Assim se faz política em Portugal. Aquilo que era absolutamente verdade, aquilo que era absolutamente imprescindível, aquilo que era absolutamente inquestionável, aquilo que era absolutamente impensável - todos nos lembramos das afirmações peremptórias da ministra da Educação: «obviamente nem todos podem chegar a generais» e «isso de não haver quotas para atingir o topo da carreira não existe em lado nenhum» e «isso é inaceitável» - de repente, já é pensável, já é aceitável, já é proposto. Mas é pensável, aceitável e será uma proposta efectiva se os sindicatos, em troca, se comprometerem a não contestar o Ministério. Eleições à porta desaconselham agitação, desaconselham manifestações de protesto, desaconselham greves, portanto, já se pode mandar às malvas aquilo que até há pouco tempo era apresentado como imperativo. Vende-se, com a maior desfaçatez, aquilo que era tido como um princípio indiscutível, para se tentar ganhar eleições. «Os fins justificam os meios» e «o que hoje é verdade amanhã é mentira» são as palavras de ordem do Governo.
É esta a seriedade política da ministra da Educação. É esta a seriedade política do primeiro-ministro. Não se muda de posição porque se reconhece um erro ou porque se evolui para uma posição que se considera melhor. Não é nenhuma destas razões que explica a radical mudança do Ministério. O que está na base desta alteração de comportamento é mercantilismo puro: é toma lá, dá cá; é troca por troca. Se a oferta for boa, os ditos inabaláveis princípios vendem-se, se a oferta for boa o inegociável já se negoceia. É o valor venal da coisa que interessa, é o preço a comandar a política. Nada mais conta.
Política desta repugna, políticos destes envergonham.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Parece que vai haver manifestação nacional a 16 de Maio

Retirado do sítio do Público (16/04/09 - 10h46):

«Em declarações ao Rádio Clube, Mário Nogueira criticou fortemente a actuação do Ministério da Educação: “Quando esta revisão pretendia acabar com a divisão da carreira docente em categorias hierarquizadas, o ministério vem reforçar a existência dessas categorias. Quando se pretendia acabar com o acesso aos escalões de topo através de vagas, o ME vem reforçar a existência de vagas. Quando se pretendia que o ingresso na carreira dependesse da formação de professores e não de uma mera prova que se realiza em hora e meia e que decide a vida de um jovem, o ME vem reforçar a existência dessa prova. E também quando se pensava que o modelo de avaliação de desempenho iria desde já começar a ser revisto e a negociar-se, já, a sua substituição, o ME pura e simplesmente quis ignorar esse seu compromisso e nem sequer apresenta qualquer tipo de proposta. É de facto, eu diria, quase provocatório”


Como forma de protesto, Mário Nogueira confirmou aos microfones da mesma rádio, à semelhança do que já tinha indicado ontem à Lusa, que os professores voltarão às ruas das principais cidades do país no próximo dia 16 de Maio: “No âmbito da plataforma sindical dos professores, aquilo que se prevê é uma grande acção de envolvimento de todos os professores na semana que culmina no dia 16 de Maio, que poderá ser uma grande manifestação de professores, uma nova grande manifestação, precisamente no dia 16, que é um sábado, ou, e alternativa, uma outra acção ao longo da semana, que inclusivamente, pode traduzir-se em recurso à greve”.

O sindicalista adiantou ainda que será lançado, “em princípio no dia 20 de Maio" – de acordo com a Lusa – o Livro Negro das Políticas Educativas. “Iremos divulgar publicamente uma publicação que é o Livro Negro das Políticas Educativas do actual Governo, que é um livro em que se relatam, não apenas, as políticas do ponto de vista mais teórico e abstracto, mas as medidas que as concretizaram, as medidas concretas, e as consequências dessas políticas e dessas medidas. Pretendemos que sejam um instrumento importante, também, neste período pré-eleitoral que aí vem”, indicou Mário Nogueira ao Rádio Clube. [...]»

Infelizmente, este é o sindicalismo que temos: intermitente. Cessa (quando não devia cessar) e recomeça, momentos de grandes alvoroços seguidos de grandes momentos de pausa, faz de conta que agudiza a luta e, na altura determinante, quebra e abandona tudo e todos à sua sorte (como aconteceu nas decisivas semanas destinadas à entrega dos objectivos individuais). Grandes barulhos e grandes silêncios.
É o sindicalismo que temos, militantemente intermitente.

Debate

http://educar.files.wordpress.com/2009/04/agir090410_debate.jpg
Para assistir à transmissão em directo ir a http://passapalavra.info ou clicar aqui!

Recordando uma caricatura. Caricatura?

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Portugal vai ser o último

«Portugal vai ser o último país da Zona Euro a sair da crise.». É esta a conclusão de Vítor Constâncio, que o Diário de Notícias realça na sua edição de hoje.

Portugal vai, então, ser o último a sair da crise. O Portugal de Sócrates, o Portugal que nos últimos quatro anos celebrava todas as semanas, pela boca do primeiro-ministro, «momentos históricos» e «recordes» absolutos, anunciados de peito cheio e de inultrapassável arrogância; o Portugal das grandes façanhas socráticas, o Portugal de vanguarda - vanguarda tecnológica, vanguarda nas energias renováveis, vanguarda na formação qualificada, vanguarda nisto, naquilo e naqueloutro. Se nos lembrarmos de tudo o que fomos ouvindo ao longo dos últimos quatro anos - quatro anos em que o país foi «posto nos carris» (Sócrates dixit) e colocado no rumo do «desenvolvimento sustentado» (Sócrates dixit) e sujeito às «reformas de fundo que ninguém tinha conseguido fazer» (Sócrates dixit) - se nos lembramos de tudo isto, podemos agora aceitar, podemos agora compreender que nos venham anunciar que vamos ser os últimos a sair da crise? É, então, este o Portugal «moderno» (Sócrates dixit) que o senhor engenheiro José Sócrates nos deixa, depois de quatro anos e meio de governação? É este o tal «Portugal preparado para o futuro» (Sócrates dixit)?
Não foi há poucos meses que o primeiro-ministro anunciou ao mundo que Portugal, devido ao excelso trabalho realizado pelo seu Governo, iria ser o país que menos sofreria com a crise? Que estávamos aptos para a enfrentar?
Hoje sabemos que nada disto era verdade. Hoje sabemos que vivemos quatro anos de publicidade, quatro anos de marketing, quatro anos de permanente encenação. Das finanças à economia e à educação, das obras públicas à cultura há um traço comum, que é a marca de água deste Governo de José Sócrates: a incompetência e o faz-de-conta.
Hoje sabemos que estes quatro anos de arrogância desmedida, de arbitrariedade e de absoluta ineficácia tiveram um resultado objectivo: vamos ser os últimos.
Mais um recorde e mais um momento histórico de José Sócrates.

Às quartas

Versos

Tão cego
apesar da felicidade da vista
tão surdo
apesar do privilégio do ouvido

Uma folha ao vento só tu na romanza
o pássaro na rede Na chuva um cantar
um verme na rosa na esperança uma armadilha
lágrimas na garganta Nas tuas palavras sangue

Tão cego
apesar da felicidade da vista
tão surdo
apesar do privilégio do ouvido

Frantisek Halas
(Trad.: Ernesto Sampaio)

terça-feira, 14 de abril de 2009

Manifestantes de Santo Onofre exigem respeito ao Ministério da Educação

Notícia no sítio do Público (14/04/09 - 21h40):
«Foram cerca de 300 pessoas as pessoas que hoje se reuniram junto ao edifício sede do agrupamento de Escolas de Santo Onofre, no concelho das Caldas da Rainha, para, sob uma chuva intensa, aprovarem e subscreverem uma moção em que exigem “respeito” e se manifestam “envergonhadas” por o Ministério da Educação (ME) “desonrar” o mandato eleitoral do conselho executivo (CE) daquele agrupamento, que a 2 de Abril foi destituído e substituído por uma comissão administrativa provisória.

O ministério destituiu a direcção eleita porque no agrupamento não tinha sido constituído o Conselho Geral Transitório, o órgão que, nos termos do novo modelo de gestão das escolas, teria como missão desencadear o processo de recrutamento do director até ao dia 31 de Março. E tomou a decisão apesar de aquela situação não resultar da vontade do CE, que por três vezes promoveu eleições sem que qualquer um dos mais de 150 professores do agrupamento se candidatasse.

Já decorria a pausa lectiva quando tal se verificou, mas a semana e meia que se seguiu não foi de descanso. Ao mesmo tempo que o secretário de Estado Valter Lemos avisava que em situações idênticas o ministério agiria “nos mesmos moldes”, o Sindicato dos Professores da Grande Lisboa e os movimentos independentes de docentes lançavam um movimento de solidariedade que alastrou na blogosfera.

Hoje, no dia do recomeço de aulas, a presidente do CE cessante foi recebida na sala de professores, pelos colegas, com uma salva de palmas. E, ao fim do dia, cerca das 18h00, reuniam-se junto à escola cerca de 300 pessoas que fizeram do pedido de “respeito” a palavra de ordem. Para além de professores do agrupamento e dos promotores da manifestação apareceram docentes e presidentes de conselhos executivos de outras escolas do país e outras personalidades, como o vereador da Câmara Municipal das Caldas da Rainha (de maioria PSD), o candidato do PS à autarquia (que também é docente da escola) e Ana Drago, do Bloco de Esquerda.

Na moção (que estava para ser votada em reunião geral de professores, mas acabou por ser aprovada durante o protesto), os subscritores consideram que “o Ministério demitiu o CE apenas porque este cumpriu as suas obrigações” e sublinham que não estão “disponíveis para aceitar que um sufrágio universal, livre, legal e democrático não deva ser honrado, quando não se reportam fundamentos de justa causa”.

“Não aceitamos que a democracia deva ficar à porta das escolas de Portugal; não aceitamos que o voto de todos seja percebido como um sistema que não serve para encontrar as melhores lideranças escolares”, “nenhuma literatura demonstra que uma liderança forte não possa ou não deva ser eleita por todos e nada permite concluir que um sistema unipessoal de gestão alguma vez tenha importado melhorias no rendimento dos nossos filhos e alunos”, alegam, no documento.

Para justificar a destituição do CE, a ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, argumentou, na altura, que “o cumprimento da lei não é facultativo”. Mas, numa adenda a um parecer sobre o novo regime de gestão das escolas, divulgado ontem, o advogado Garcia Pereira defende que, pelo contrário, as interrupções dos mandatos de CE são inconstitucionais, ilegais e até perigosas.»
Nota: O azul carregado é nosso.

Não há uma única razão que justifique o acto da ministra da Educação. É um acto de pura arbitrariedade e de absoluta prepotência: o conselho executivo não tem nenhuma responsabilidade na não eleição do conselho geral transitório.
E o que o artigo 66.º do Decreto-Lei nº 75/2008 prevê é:
«1 - Nos casos em que não seja possível realizar as operações conducentes ao procedimento concursal para recrutamento do director, que o procedimento concursal tenha ficado deserto ou que todos os candidatos tenham sido excluídos, a sua função é assegurada por uma comissão administrativa provisória constituída por três docentes, nomeada pelo director regional de educação respectivo, pelo período de um ano escolar»
O acto do ministra da Educação viola a própria lei, por duas razões:
1. O que o nº1 do artigo 66.º prevê é que as funções do director, caso ele não tenha sido escolhido, sejam asseguradas por uma comissão admministrativa. São as funções do director que são asseguradas por uma comissão administrativa, não as do Conselho Executivo;
2. Essa comissão administrativa tem um mandato com a duração de
um ano escolar. Ora a comissão administrativa agora nomeada vai ter um mandato que abrange todo o 3º período do presente ano escolar e ainda o próximo ano escolar. Isto é, trata-se de um mandato que ultrapassa o período que a lei objectivamente determina.
A ministra da Educação mantém-se coerente: permanece política e tecnicamente incompetente, continua arrogante, prepotente e a não perceber rigorosamente nada de Educação.

Para quem ainda não percebeu a crise

Bonecos de palavra

Clicar em cima da imagem para ver em tamanho normal.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Protesto e Solidariedade

http://protestografico.files.wordpress.com/2009/04/santoonofre.jpg
©ProtestoGráfico
Acção promovida pelo SPGL e Movimentos Independentes (APEDE, MEP, MUP, PROmova)

Concentração junto à sede do Agrupamento de Santo Onofre, dia 14 de Abril, 18 horas

Comunicado do Movimento PROmova

O PROmova subscreve, integralmente, a tomada de posição da Direcção do SPGL a propósito da intervenção despótica e ressabiada do ME na autonomia do Agrupamento de Escolas de Santo Onofre e exorta os professores, assim como os demais cidadãos preocupados com a deriva anti-democrática que tem caracterizado a postura e as medidas desta equipa ministerial, as quais se têm traduzido em sistemáticos ataques à Escola Pública, a participarem na Concentração proposta pelo SPGL para o dia 14 de Abril, pelas 18:00 horas, junto à sede do Agrupamento de Escolas de Santo Onofre, nas Caldas da Rainha. Em coerência com as posições assumidas desde o início desta intervenção infeliz por parte do ME, o PROmova reafirma a sua incondicional solidariedade com os professores do Agrupamento de Santo Onofre e sugere aos colegas do Conselho Executivo, entretanto deposto, a criação de uma conta bancária, cujo NIB possa ser divulgado a nível nacional, de molde a que os professores de todo o país possam ajudar a suportar financeiramente a contestação judicial da decisão do ME, a partir da contratação de uma excelente equipa de advogados e tendo por base o parecer do Prof. Dr. Garcia Pereira.
Além destas iniciativas, o PROmova apela a todos os professores para que, no quadro da semana de reflexão que a Plataforma Sindical vai promover nas escolas, manifestem por escrito o seu repúdio face a este atentado à autonomia e à qualidade da Escola Pública, bem como sugere a todos que possa ser equacionado, nessas reuniões, o tipo de destaque que deve ser dado aos docentes do Agrupamento de Santo Onofre na grande Manifestação de Maio, enquanto símbolos da contestação à miserável política educativa deste Governo. Seria um gesto de transcendente significado.
Os professores do Agrupamento de Escolas de Santo Onofre podem estar cientes de que o PROmova e os professores identificados com este movimento continuarão a acompanhá-los na rejeição deste modelo de gestão e na recusa em participar em qualquer acto relacionado com este modelo de avaliação, bem como na não aceitação da divisão da carreira.
Já os colegas que, de forma oportunista e traiçoeira, aceitaram o desgraçado papel de pau-mandado do ME, não contem com nenhum respeito e nenhuma consideração da parte do PROmova. A própria circunstância de dois dos indigitados serem dirigentes da FNE (que já surpreendera os professores com mensagens contraditórias a propósito da entrega dos objectivos individuais) e da reacção da direcção ter sido tíbia e nada convincente, deve merecer um sinal de forte reprovação por parte dos professores que ainda mantêm o seu vínculo a esta estrutura sindical.
PROmova

Notas do fim-de-semana

Como Costa foi demitido em Macau
«Foi apenas a ajuda do então governador, Carlos Melancia, que evitou que Alberto Costa fosse condenado em 1989 por pressionar um juiz em Macau. O agora ministro, apontado como autor de pressões no caso "caso Freeport", foi ainda assim exonerado de director dos Assuntos da Justiça do território.
O caso, passado há 21 anos, envolveu Alberto Costa e o juiz José Manuel Celeiro, que decretara a prisão preventiva do presidente da TDM (televisão de Macau). Alberto Costa terá, segundo o magistrado, tentado alterar a medida de coacção, "em conversas informais". E por isso José António Barreiros, então secretário de Estado da Justiça, demitiu-o.
"Demiti Alberto Costa por despacho fundamentado" - recordou esta semana José António Barreiros - "que se baseia no que foi adquirido por um inquérito realizado pelo procurador-geral adjunto do território: contactara um juiz por duas vezes com o propósito de que este arquivasse um processo e soltasse dois arguidos presos.
O procurador do inquérito então realizado acusou Alberto Costa e também o chefe de gabinete, António Lamego, de "indevida interferência e pressão" do magistrado. [...]»
Sol (10/04/09)


Dito & Feito
«Em poucos dias, José Sócrates e o seu Governo avançaram com processos judiciais contra três jornalistas do Público, contra a TVI, contra o SOL, devido à divulgação de notícias relacionadas com o caso Freeport ou matérias afins. E até interpuseram uma queixa-crime contra um jornalista do DN por causa de um normal artigo de opinião, em tom de crítica irónica e corrosiva mas não ofensiva, que terá desagradado particularmente à irritadiça susceptibilidade do primeiro-ministro. Não há memória, no passado recente, de um chefe de Governo com tão exacerbado furor punitivo contra a comunicação social e com tamanha incompatibilidade de conviver com uma informação livre e plural, sem dependências nem constrangimentos, e, por isso, inconveniente para os poderes em exercício.
Sócrates revela-se um paroquial aprendiz de Berlusconi, na sua fúria antidemocrática contra a diversidade de críticas e opiniões que ponham em causa a sua figura, os seus actos, o seu transitório poder.
Mas este passo, o dos processos em tribunal e ameaças de pesadas indemnizações, é apenas o coroar de uma estratégia de condicionamento e intimidação da comunicação social não alinhada com o Governo. Estratégia que começou com pressões directas, de Sócrates e dos seus assessores, sobre vários jornalistas por ocasião das primeiras notícias sobre a sua estranha licenciatura na Universidade Independente. Que prosseguiu com manobras de coacção e de asfixia financeira sobre patrões e empresas de media. Que se acentuou, perante a sucessão de episódios mal esclarecidos da vida e da carreira de Sócrates, com intervenções e inquéritos da ERC em oportuna convergência com as reclamações do próprio.
E que culminou agora, já em desespero de causa devido ao continuado desgaste do caso Freeport, com pressões sobre magistrados e o poder judicial acompanhadas desta chuva de processos à la carte contra jornalistas e órgãos de comunicação social.
São sinais preocupantes de intolerância face a princípios e direitos basilares da vida democrática. E sintomas de uma perigosa deriva para o autoritarismo. Não era Mário Soares que falava dos riscos da «ditadura da maioria»? Mas é fácil e barato pôr acções intimidatórias em tribunal, para quem não suporta as custas dos processos e os honorários dos advogados. Sócrates e a sua maioria controleira decidiram, agora, usar advogados como novos coronéis do lápis azul da censura. Pagos, como dantes, pelo Estado.»
José António Lima, Sol (10/04/09)


Ao Léu
«A história da mini-saias das lojistas cidadanescas de Faro é um sonho erótico para nós comentadores. Tem tudo: sexo; moralismo; direitos humanos e uma santa senhora chamada Pulquéria. É uma mina, com veios suficientes para todos nós explorarmos um só nosso.
A mim tem-me divertido que ninguém tenha notado na ausência de normas para os funcionários. Onde está a proibição de depilarem o escroto? Ou de desabotoarem a camisa para abanarem o medalhão de bronze entre os caracóis macacóides do peito? Ou o tanger do fio dental, através do jogo nádega-contra-nádega de um passo gingão?
Ou os homens também não dão vontade de lhes saltar para cima? Não é proibida a discriminação? Porque serão só as gajas a ter de refrear a sexualidade galopante que as faz derramar as mamas sobre o balcão? Acaso faltam aos machos lugares onde anichar o novo cartão do cidadão, se houver ocasião de entreter algum freguês?
Também tenho gostado de detectar a osmose de fantasias sexuais dos jornalistas para o tecido das notícias. No PÚBLICO de ontem, apesar de admiravelmente factual e contido, Idálio Revez não resistiu a propagar a feliz combinação que é "decote generoso". Fica-se com aa ideia que o conceito de generosidade, aplicado às mamas, não foi da autoria da Dona Pulquéria, mas sim de algum macho lusitano que até nem se importaria que nesse aspecto houvesse, por parte das mulheres, menos forretice.
É ouro puro e caso para agradecer de joelhos. Ao léu.»
Miguel Esteves Cardoso, Público (12/04/09)

domingo, 12 de abril de 2009

Pensamentos de domingo

«É pecado pensar mal dos outros, mas é raramente errado.»
H. L. Mencken

«Eu penso o pior de todas as pessoas, mesmo acerca de mim, e raramente erro.»
Johann N. Nestroy

«Um pepino deve ser bem cortado às fatias, bem temperado com pimenta e vinagre e a seguir deitado fora.»
Samuel Johnson
In José Manuel Veiga, Manual para Cínicos.

Enrico Rava e Richard Galliano

sábado, 11 de abril de 2009

Ao sábado: momento quase filosófico

Acerca do Método Científico - 1
«Hoje em dia, parece uma tarefa fácil perceber que todo o conhecimento do mundo exterior nos chega através dos sentidos. Mas nem sempre foi assim. Muitos filósofos em épocas passadas pensaram que havia algumas ideias inatas nas nossas mentes que estavam lá a priori - ou antes da experiência. Alguns pensavam que as nossas ideias de Deus eram inatas; outros afirmavam que a nossa ideia de causalidade também era inata.
Mesmo actualmente, quando alguém diz: "Tudo acontece por um motivo", ou: "Acredito na reencarnação", está a proferir uma declaração que não pode ser confirmada nem refutada pela experiência. Todavia, a maioria das pessoas aceita que a melhor prova da verdade de uma afirmação sobre o mundo exterior é a experiência sensorial, e nesse sentido somos todos empiristas.
Isto é, a menos que sejamos o rei da Polónia, a excepção que comprova a regra:
O rei da Polónia e uma comitiva de duques e condes saíram para uma caçada real ao alce. Quando se aproximaram do bosque, um servo saiu de trás de uma árvore a correr, a acenar freneticamente os braços e a gritar:
- Eu não sou um alce!
O rei fez pontaria e alvejou o servo com um tiro no coração, matando-o instantaneamente.
- Bom rei - disse um duque -, porque fizestes aquilo? Ele disse que não era um alce.
- Valha-me Deus - replicou o rei. - Pensei que ele tinha dito que era um alce.
Muito bem, agora comparemos o rei com um cientista importante.
Um cientista e a mulher foram dar um passeio pelo campo. A mulher diz:
- Oh, repara! Aquelas ovelhas foram tosquiadas.
- Sim - declara o cientista. - Deste lado.
À primeira vista, poderíamos pensar que a mulher está apenas a expressar uma visão de senso comum enquanto o cientista formula uma opinião mais cautelosa e científica, na medida em que se recusa a ir para além da prova dos sentidos. Mas estamos errados. Na verdade, foi a mulher que formulou o que a maioria dos cientistas consideraria a hipótese mais científica. A "experiência" dos empiristas não se restringe à experiência sensorial directa. Os cientistas usam as suas experiências anteriores para calcular probabilidades e para inferir afirmações mais genéricas. O que a mulher está, com efeito, a dizer é: "estou a ver ovelhas tosquiadas, pelo menos deste lado. Pela experiência anterior sei que não é habitual os agricultores tosquiarem ovelhas apenas de um lado e que, mesmo que este agricultor o tivesse feito, a probabilidade de as ovelhas se colocarem na encosta de forma a que apenas os seus lados tosquiados ficassem voltados para a estrada é infinitesimal. Por conseguinte, sinto-me confiante ao dizer: "Aquelas ovelhas foram totalmente tosquiadas."
Presumimos que o cientista da piada é uma espécie de crânio demasiado instruído. Mais tipicamente, presumimos que uma pessoa que não consegue extrapolar a partir da sua experiência anterior é simplesmente um imbecil ou, como dizem na Índia, um sardar.
Um polícia de Nova Deli interroga três sardars que estão a treinar para detectives. Para testar as suas capacidades de reconhecimento de um suspeito, mostra ao primeiro sardar uma fotografia durante cinco segundo e depois esconde-a.
- Este é o teu suspeito. Como é que o reconhecerias?
- É fácil, vamos apanhá-lo depressa porque ele só tem um olho! - responde o sardar.
- Sardar! Isso é porque na fotografia que te mostrei o suspeito está de perfil - afirma o polícia.
Em seguida, o polícia mostra a fotografia ao segundo sardar durante cinco segundos e pergunta:
- Este é o teu suspeito. Como é que o reconhecerias?
- Ah! Não será difícil apanhá-lo porque tem apenas uma orelha!
Zangado, o polícia replica:
- Que é que se passa com os dois? É claro que só se vê um olho e uma orelha porque é uma fotografia de perfil!
É a melhor resposta que conseguem dar-me?
Já extremamente frustrado, mostra a fotografia ao terceiro sardar e, num tom muito irritado, pergunta:
- Este é o teu suspeito. Como é que o reconhecerias?
O sardar olha intensamente para a fotografia durante um momento e diz:
- O suspeito usa lentes de contacto.
O polícia é apanhado de surpresa porque não sabe se o suspeito usa ou não lentes de contacto.
- Bem, é uma surpresa interessante - reconhece. - Esperem aqui enquanto vou verificar o cadastro e já volto com uma resposta.
Sai da sala, dirige-se para o seu gabinete, verifica o cadastro do suspeito no computador e regressa, sorridente.
- Uau! Não posso acreditar. É verdade! De facto, o suspeito usa lentes de contacto. Bom trabalho! Como é que conseguiste fazer uma observação tão astuta?
- Foi fácil - respondeu o sardar. - Ele não pode usar óculos porque só tem um olho e uma orelha.»
Thomas Cathcart e Daniel Klein, Platão e um Ornitorrinco Entram num Bar...
(«Acerca do Método Científico - 1» continua no próximo sábado)

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Uma licenciatura manhosa

É conhecido que José Sócrates apresentou uma queixa-crime contra o jornalista João Miguel Tavares, por uma crónica que ele escreveu no Diário de Notícias. O conteúdo dessa crónica - que, por acaso, eu postei neste blogue, no passado dia 4 de Março, e que, na altura, subscrevi e volto, hoje, a subscrever - foi considerado, pelo primeiro-ministro, como merecedor de uma queixa-crime porque continha, entre outras, a seguinte expressão: «licenciatura manhosa».

Ora vamos lá ver: afirmar que José Sócrates tirou uma licenciatura manhosa é crime? Sinceramente, não vejo porquê. Acho até que é uma classificação soft. Atentemos no significado do termo manhoso (a): «que tem manha»; manha: «qualidade ou defeito de alguma coisa que dificulta a compreensão, uso ou manejo» (conf. Grande Dicionário da Língua Portuguesa, coordenação de José Pedro Machado; e Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, coordenação de João Malaca Casteleiro). É evidente que o termo manhoso (a) tem outros significados, mas aplicados a pessoas, não a coisas; ora uma licenciatura é uma coisa (por mais manhosa que seja), não é uma pessoa, logo, é aquele o significado que tem e não outro (eventualmente mais manhoso...).
Então, é crime considerar que a licenciatura de José Sócrates é manhosa? Isto é, que é uma licenciatura que tem a «qualidade ou defeito de alguma coisa que dificulta a compreensão, uso ou manejo»? Dizer isto é crime? Não é um dado objectivo que a licenciatura de José Sócrates é mesmo manhosa? Aliás, mais que manhosa, manhosíssima? Se não fosse manhosa, ou seja, se não tivesse a «qualidade ou defeito de alguma coisa que dificulta a compreensão, uso ou manejo», ela teria sido objecto de tanta notícia, de tanto comentário, de tanta investigação, de tanta explicação - até pelo próprio José Sócrates, que emitiu comunicados e foi à televisão desfazer-se em explicações sobre a sua licenciatura? Se a sua licenciatura não fosse algo que dificultasse a compreensão, isto é, se fosse transparente, se fosse normalzinha como qualquer outra licenciatura, seria possível existir tanta polémica, seria necessária tanta explicação, alguém se interessaria por uma coisa absolutamente banal e de básica compreensão? Claro que não.
Por exemplo, alguém comentou a licenciatura de Cavaco Silva, ou a de Jorge Sampaio, ou a de António Guterres? Ou a minha, já agora? Investiguem lá as nossas licenciaturas, a ver se dão a polémica que deu a licenciatura de José Sócrates. Oh dão! E porque que é que não dão? Porque as nossas não são manhosas, porque as nossas não têm a «qualidade ou defeito de alguma coisa que dificulta a compreensão, uso ou manejo». São limpinhas, não têm a qualidade de dificultar a compreensão. A licenciatura de José Sócrates tem essa qualidade, dificulta a sua compreensão. E agora? É o jornalista João Miguel Tavares que tem culpa disso? É ele que vai pagar pela licenciatura de José Sócrates ter a tal qualidade de dificultar a sua compreensão?
João Miguel Tavares, eu sei que não serve de nada, mas, olhe, volto a escrever o que escrevi no dia 4 de Março, quando postei o seu artigo neste blogue: assino por baixo, palavra a palavra, toda a sua crónica. E se precisar de uma testemunha abonatória, diga, estou à sua inteira disposição. Temos de ser uns para os outros, anda por aí cada... nhoso...!

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Directores das escolas podem ter decisões impugnadas

No Diário de Notícias de hoje:

«Especialista em Direito do Trabalho diz que é "ilegal" afastar conselhos executivos com mandatos por cumprir, como aconteceu em Santo Onofre. E avisa o ministério que eleições "ilegítimas" podem gerar "consequências em cadeia".

A destituição do Conselho Executivo da Escola Básica de Santo Onofre, pela Direcção Regional de Educação de Lisboa (DREL), foi um acto "completamente ilegal". Quem o diz, ao DN, é o especialista em Direito do Trabalho Garcia Pereira, que avisa o Ministério da Educação de que todos os directores que substituam conselhos executivos com mandatos por cumprir poderão ficar numa situação de poder "ilegítimo" e ver todos os seus actos "impugnados" .

"O Ministério da Educação está a brincar com o fogo, e ainda não se apercebeu que esta lógica de impor os factos consumados pode ter consequências em cadeia", defende o jurista. "Decisões como a avaliação dos professores, definições de horários, quaisquer actos administrativos podem ser anulados se o director não tiver legitimidade para os tomar."

As escolas estão neste momento a desencadear os concursos públicos para a selecção de candidatos ao cargo de director, que, de acordo com as orientações da tutela, terá de ser eleito até 31 de Maio por um conselho geral composto por professores e funcionários, autarcas e pais de alunos.

Mas Garcia Pereira garante que a própria lei que define esta eleição - o regime de autonomia e gestão das escolas (D.L. 75/2008) -"salvaguarda" a situação dos conselhos executivos que ainda não acabaram os mandatos de três anos: "O artigo 63, n.º 2 define que os actuais conselhos executivos completam os seus mandatos".

O mesmo diploma refere que os mandatos dos conselhos executivos são "prorrogados" até à eleição do director. Mas o advogado garante que essa regra em nada altera a situação: "Em Direito, 'prorrogar' significa prolongar além do prazo normal, neste caso para evitar uma situação de vazio de poder. Não significa encurtar".

No caso de Santo Onofre, a DREL substituiu o conselho executivo - ainda com um ano de mandato - por uma comissão administrativa transitória, alegando que não tinham sido desencadeados os procedimentos para escolha do director. Mas a eleição não aconteceu por opção dos docentes da escola, que nunca concorreram ao conselho geral transitório, a que cabia desencadear o processo.

Outra situação, noticiada no fim-de-semana pelo DN, prende- -se com a Secundária de Peso da Régua. Ali, na sequência de uma longa batalha judicial com o ministério, o actual conselho executivo acabou por ser eleito há cerca de uma semana. E já anunciou que vai avançar com uma providência cautelar para impedir a sua substituição por um director.

Garcia Pereira diz que mesmo nas situações em que conselhos executivos com mandatos por cumprir tenham "obedecido às ordens" do ministério, a eleição do director poderá ser impugnada. Mas recomenda a quem se sinta lesado "que marque a sua posição, para que não venha depois a ser invocado um consentimento tácito."

O DN contactou o Ministério da Educação, mas não obteve respostas em tempo útil.»

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Às quartas


Supremo Enleio


Quanta mulher no teu passado, quanta!
Tanta sombra em redor! Mas que me importa?
Se delas veio o sonho que conforta,
A sua vinda foi três vezes santa!

Erva do chão que a mão de Deus levanta,
Folhas murchas de rojo à tua porta...
Quando eu for uma pobre coisa morta,
Quanta mulher ainda! Quanta! Quanta!

Mas eu sou a manhã: apago estrelas!
Hás-de ver-me, beijar-me em todas elas,
Mesmo na boca da que for mais linda!

E quando a derradeira, enfim, vier,
Nesse corpo vibrante de mulher
Será o meu que hás-de encontrar ainda...

Florbela Espanca

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Uma conjura mundial

Aproveito o facto de estar fora do país para, com mais facilidade, percorrer as páginas da imprensa internacional. Faço-o avidamente, desde a passada sexta-feira, mas sempre em vão. Não encontro o que procuro. Vejo página a página, linha a linha, leio as gordas, leio as magras, e nada. Jornais ingleses, franceses, espanhóis, italianos e alemães são unânimes na ocultação da verdade. Uma inadmissível cabala da imprensa internacional decidiu esconder o facto decisivo da recente cimeira dos G20. E suspeito que a cabala não abranja apenas a imprensa, calculo que Gordon, Sarkozi, Merkel e o próprio Obama também façam parte da conjura. Não há outra explicação.
Neste momento não tenho dúvidas: à campanha negra nacional juntou-se, agora, uma campanha negra internacional. O mundo inteiro está contra o nosso primeiro-ministro. E esta campanha internacional não começou agora. Não, ela tem já umas semanas: desde que nosso primeiro foi obrigado a revelar ao planeta que foi ele quem fez as taxas de juro baixarem na zona euro. Todos os lideres europeus calaram-se, esconderam a verdade. Teve que ser ele, José Sócrates, a custo, a empurrão, a vir dizer para a frente das câmaras de televisão o que se passou, quem foi a personagem decisiva nesse momento histórico: ele próprio.
E, agora, novamente a mesma história. Mas para pior, porque, desta vez, envolve dirigentes de todo o mundo. E, novamente, ninguém conta a verdade. Novamente, ninguém conta o que se passou. Novamente, ninguém fala do papel único, do contributo decisivo que, obviamente, o nosso José Sócrates teve para que fosse possível alcançar-se mais um momento histórico. Desta vez, não apenas para Portugal, desta vez, não apenas para a Europa, mas para o mundo inteiro: o acordo a que o G20 chegou e a instauração de uma nova ordem mundial.
Por causa disso, o mundo vai mudar, foi anunciado. Ora, alguém acredita que tal seria possível sem a intervenção pessoal e directa de José Sócrates?

Além das forças ocultas, também as forças visíveis, e escancaradas, deram em conspirar contra Sócrates

«Quem é Lopes da Mota, a nova e radiosa personagem do caso Freeport? A questão é duplamente pertinente, já que alguma imprensa, pouco versada no homem, começou por lhe chamar Lopes da Costa. Talvez "da Mota" seja alcunha, ao estilo de "Chico da Carrinha" ou "José Diogo do Tractor".
Baptismo de lado, importa que o dr. da Mota é magistrado, passou pelo tribunal de Felgueiras e pela secretaria de Estado da Justiça no primeiro executivo de António Guterres, chegou a secretário-geral da PGR e, desde 2002, preside ao organismo que combate a corrupção e o crime organizado na União Europeia. Noutra perspectiva, a que saiu nos jornais com imensas variações do substantivo "alegado", o dr. da Mota foi o amigo de Fátima Felgueiras sobre quem recaíram suspeitas de ter alertado previamente a senhora para a investigação que a visava. Foi o substituto "natural" de Cunha Rodrigues na PGR que, aparentemente graças às suspeitas (arquivadas) acima, não chegou a ser. E foi a sumidade que, há sete anos, correu para o Eurojust antes que o Governo mudasse de cor ou antes que o Eurojust fechasse as portas por não contar com os seus valiosíssimos préstimos.
Hoje, ainda de acordo com os jornais, adiciona ao posto em Haia alegadas funções de intermediário do Governo junto dos investigadores do Freeport. Os investigadores, alegadamente, admitem que a generosidade do dr. da Mota lhes permitiu a alegada escolha: ou arquivavam o processo ou teriam percalços na carreira. Confrontado com a alegação de pressões, o PGR garantiu não existirem pressões. A seguir, garantiu ir investigar a existência de pressões. Depois, tentou em vão convencer os investigadores e o dr. da Mota a declararem em uníssono a inexistência de pressões. Por fim, e por enquanto, criticou a procuradora adjunta por não o avisar das pressões.
A moral da história? Aqui, os dois termos parecem incompatíveis, mas sobretudo há que lamentar o azar do eng. Sócrates: além das forças ocultas, também as forças visíveis, e escancaradas, deram em conspirar contra ele.»
Alberto Gonçalves, Diário de Notícias (5/04/09)

domingo, 5 de abril de 2009

Pensamentos de domingo

«Actualmente eu considero os tribunais não como catedrais mas como casinos.»
Richard Ingrams

«O sucesso não me subiu à cabeça. Eu fui sempre insuportável.»
Fran Lebowitz

«A única coisa mais irritante que um vizinho com um carro velho e barulhento é um vizinho com um carro novo e silencioso.»
Times Syndicate
In José Manuel Veiga, Manual para Cínicos.

Bobby Hutcherson

sábado, 4 de abril de 2009

Ao sábado: momento quase filosófico


Acerca do Empirismo

Segundo o empirista irlandês do século XVII, Bishop George Berkeley, "Esse est percipi" ("Ser é ser percebido"), que equivale a dizer que o pseudomundo objectivo está todo na mente. Berkeley argumentou que o nosso único conhecimento deste mundo é o que nos chega através dos sentidos. (Os filósofos chamam a esta informação "dados dos sentidos"). Berkeley afirmou que, para além desses dados dos sentidos, não é possível deduzir mais nada, como a existência de substâncias externas a enviar vibrações que estimulam os nossos sentidos. Mas o bom Bishop foi mais longe e sugeriu que os dados dos sentidos têm de vir de algum lado, por isso esse algum lado tem de ser Deus. Basicamente, a ideia de Berkeley é que Deus está no alto a inserir dados numa Internet cósmica na qual estamos todos sintonizados 24/7. (E nós que sempre pensámos que Deus só trabalhava 24/6!)
[...]
As coisas tornam-se mais complicadas quando a fonte dos nossos dados dos sentidos é outro ser humano:
Um homem está preocupado porque pensa que a mulher está a ficar surda, por isso vai ao médico. O médico sugere-lhe que experimente um simples teste em casa: parar atrás dela e fazer-lhe uma pergunta, primeiro a seis metros, depois a três metros e, por fim, mesmo atrás dela.
O homem vai para casa e vê a mulher na cozinha, virada para o fogão. Da porta, pergunta:
- Que vamos jantar esta noite?
Nenhuma resposta.
Três metros atrás dela, repete:
- Que vamos jantar esta noite?
Continua sem resposta.
Por fim, mesmo atrás dela, pergunta:
- Que vamos jantar esta noite?
A mulher volta-se e diz:
- Pela terceira vez... frango!
Não há dúvida de que este casal tem um sério problema de interpretação de dados dos sentidos.
Thomas Cathcart e Daniel Klein, Platão e um Ornitorrinco Entram num Bar...