quarta-feira, 9 de setembro de 2009

E se a avaliação do professor for negativa, o professor progride?

«E se a avaliação do professor for negativa, o professor progride? E se a avaliação do professor for negativa, o professor progride? E se a avaliação do professor for negativa, o professor progride?» Foi esta a pergunta insistentemente repetida por Santos Silva ao representante do PCP, no programa, da RTP1, Prós e Contras, realizado na passada segunda-feira.
Santos Silva formulava esta pergunta possuído da certeza de ter descoberto a questão mortífera, possuído da certeza de ter encontrado o princípio, o axioma que separa as águas entre aqueles que estão verdadeiramente a favor da avaliação e aqueles que só aparentemente estão a favor. Por seu lado, o representante do PCP engasgava-se, balbuciava uma resposta, mudava de direcção no discurso, ia à frente, voltava atrás, virava para o lado, sem saber o que dizer. Enfim, uma cena triste representada por dois péssimos actores: Santos Silva porque fez o papel medíocre de manipulador da opinião pública e o representante do PCP porque tinha obrigação de saber responder a uma provocação básica e não soube, e permitiu que o manipulador saísse ganhador.
É óbvio que só há uma resposta: o professor não progride. Mas a resposta não termina aqui. Para este Governo a resposta acaba, de facto, aqui, mas para quem não é medíocre no pensamento e para quem, efectivamente, quer um sistema educativo melhor, uma escola melhor, onde cada vez se ensine melhor e se aprenda melhor, a resposta não termina aqui. A resposta continua. E continua nestes termos:
1. Se a avaliação for negativa, o professor não progride, num sistema sério e competente de avaliação do desempenho dos professores.
2. Um sistema sério e competente de avaliação não coloca arbitrariamente professores a avaliar outros professores.
3. Um sistema sério e competente de avaliação não coloca professores sem qualquer qualificação nem preparação a avaliar outros professores.
4. Um sistema sério e competente de avaliação não coloca directores de escola sem nenhuma preparação nem qualificação a avaliar outros professores (relembre-se que aos directores nem é exigida a categoria de professor titular, que, dentro da própria lógica do Ministério da Educação, é condição sine qua non para ser avaliador).
5. Um sistema sério e competente de avaliação não condiciona a avaliação dos professores às notas dos alunos.
6. Um sistema sério e competente de avaliação não impede que professores muito bons e excelentes tenham a classificação de muito bom e excelente.
7. Um sistema sério e competente de avaliação não permite que os professores possam formular os seus objectivos individuais, relativos a um ano lectivo inteiro, um mês ou quinze dias antes desse ano lectivo terminar.
8. Um sistema sério e competente de avaliação não admite que, observando apenas duas aulas, se possa classificar um professor de excelente.
9. Um sistema sério e competente de avaliação não assenta numa monstruosidade de itens e subitens avaliativos inoperacionais e incompetentes.
10. Um sistema sério e competente de avaliação não pode pretender impor um modelo único de professor.
11. Um sistema sério e competente de avaliação não tem como objectivo a punição pela punição nem o prémio pelo prémio.
12. Um sistema sério e competente de avaliação não assenta na concepção primária e estúpida de elaboração de um quadro de honra de professores em cada escola.

Pelo contrário, um sistema sério e competente de avaliação tem como objectivo: avaliar para formar, avaliar para elevar a qualidade do desempenho do avaliado, para que, dessa melhoria, os alunos sejam os primeiros beneficiários, para que a escola e o sistema educativo sejam melhores.
Um sistema sério e competente de avaliação tem como pressuposto que:
1. A avaliação é algo demasiado sério e complexo para ser objecto de brincadeiras e amadorismos.
2. O acto de avaliar exige do avaliador uma humildade extrema.
3. A atomização dos comportamentos produz uma falsa objectividade.
4. Aquilo a que está na moda chamar de «evidências» é tudo menos evidente.
5. O acto de avaliar é inevitavelmente subjectivo e que alguma objectividade só se alcança quando há uma grande partilha intersubjectiva.
6. O sentido primeiro do acto de avaliar reside no seu carácter formativo.
7. A dimensão sumativa da avaliação, por exemplo na avaliação dos alunos, só existe por uma «exigência» social de estratificação ou de selecção (como é o caso de seleccionar os alunos que podem ter acesso a cursos do ensino superior, ou o caso de «ajudar» as empresas a seleccionar os seus futuros profissionais). A dimensão sumativa é um «acrescento» ao exercício da avaliação, não é a sua dimensão central, e muito menos a sua essência. A sua essência é formativa. Mas não é formativa porque isso faça da avaliação algo de menos assustador ou de mais simpático, é formativa por razões substantivas:
. O ser humano quando avalia fá-lo, em regra, para aprender com o que fez, para que, no futuro, consiga fazer melhor. Basicamente, é isto, o seu carácter formativo, que tem possibilitado que o ser humano evolua ao longo do tempo.
. O acto de avaliar objectos complexos, como é o acto de avaliar algumas das actividades humanas, é um exercício de enorme dificuldade e de muito baixa fiabilidade. Deste modo, os seus resultados têm, de facto, uma credibilidade reduzida. Ora não há nada de mais perigoso e injusto do que atribuir elevada objectividade àquilo que a não tem.

A dimensão formativa é, por conseguinte, aquela que, pelas suas características, recolhe o que de melhor a avaliação possui e evita o que de pior ela tem.
Os méritos e os prémios, porque parece que o ser humano também se motiva com eles, poderão vir por acrescento e até, normalmente, vêm por reconhecimento, muitas vezes, consensual.
O que não pode acontecer é um processo de avaliação assentar na atribuição do prémio e na atribuição do castigo, como fins em si mesmos.
Fazer isso, como este Governo faz, não é apenas alimentar um mito, é também revelador de um primarismo confrangedor.