quinta-feira, 24 de abril de 2008

Estive mesmo para comprar o Correio da Manhã (4)

Hoje, opto por transcrever alguns excertos da entrevista que servem para ilustrar como na tal «pequena sala do 13.º andar do Ministério da Educação» a empatia era imensa e a concordância absoluta: entrevistador e entrevistada viveram momentos de inquestionável harmonia.
É uma entrevista de antologia. António Ferro era um amador comparado com o jornalista Ferreira, na arte de idolatrar, e Maria de Lurdes Rodrigues é insuperável na arte de bem aparentar. Contudo, dizem, a verdade tem aquela arreliadora semelhança com o azeite, mais cedo ou mais tarde...

Mas retomando o ponto onde tínhamos ficado na 3ª parte da narrativa: no seguimento da questão sobre a chantagem, o jornalista Ferreira pergunta, um pouco escandalizado com a infame acusação de que a ministra tinha sido alvo:
- Foi isso que alguns apelidaram de chantagem?
Resposta da ministra:
- Claro. O que acontece é que Governo nenhum, na minha opinião, estaria disponível para abrir uma excepção para os professores num quadro em que toda a administração pública está a ser avaliada e tem condicionamentos na sua progressão em função dos resultados da avaliação.
O jornalista acorre, de imediato, mostrando total compreensão:
- E os professores não têm consequências tão gravosas, pois não? (não temos o som, mas imagina-se o tom...)
Confirmação imediata da ministra:
- No caso da administração pública é pior porque mesmo com avaliações positivas o que acontece é que as progressões estão dependentes da autorização da chefia directa, de questões orçamentais.
Solícito, o jornalista Ferreira completa:
- Estão limitadas.
Prossegue a ministra, num crescendo de harmonia:
- Exactamente. E no caso dos professores a situação é muito diferente porque nós temos a noção de que a função docente é diferente, mais exigente, tem outras características, tem um modelo diferente. Agora não podíamos criar uma situação em que não concretizando a avaliação se colocava o problema do que é que acontecia na carreira.
Com ternura, o jornalista Ferreira remata/comenta/pergunta (não sei como classificar):
- A chantagem, em suma, foi apenas esse alerta? (os professores são tão injustos, não são, jornalista Ferreira?)
Pois, evidentemente, concorda a ministra:
- Isso foi lido por alguns sectores como sendo chantagem. Na minha opinião foi apenas a clarificação da situação. Porque eu ouvi muitos dirigentes sindicais, no momento mais alto da contestação, dizerem que não ia acontecer nada porque os professores não podem ser prejudicados.
Incansável, o jornalista Ferreira, pensando que ainda não tinha sido suficientemente solidário, apressa-se a concluir/comentar/perguntar (ou lá o que for):
- Quis avisá-los que iam mesmo ser prejudicados?
Ao que se segue mais um «exactamente» ministerial:
- Exactamente. Seriam seguramente prejudicados porque nenhum Governo, este ou outro qualquer, de criar [sic] uma situação de excepção para os professores. E era mau, muito mau para os professores.
Com sincera ingenuidade, pergunta o jornalista Ferreira:
- Porquê?
Com não menor sinceridade, responde a ministra:
- Porque era transmitir à opinião pública a mensagem de que os professores estão fora daquilo que é a normalidade.
Inexcedível, o jornalista Ferreira completa/comenta/interroga o raciocínio da entrevistada:
- De que eram uma excepção?
«Exactamente», pensa a ministra, mas não o diz, inibe o advérbio:
- Uma excepção, um corpo à parte. Os professores não precisam disso. Os professores não precisam de ser um corpo à parte. Precisam de ter condições diferentes do resto da administração pública, como têm neste modelo de avaliação.

Eu sei. Eu sei que ler isto irrita.
Mas, olhem, amanhã, para compensar, não tenho intenção de voltar ao assunto. Fica para a semana.
Amanhã é 25 de Abril.